Fumaça:
de quem é a culpa?
Professor
Nazareno*
Agosto
de 2024. Rondônia e a sua capital Porto Velho desaparecem sob a fumaça das
queimadas. Como nos últimos 50 ou 60 anos, a realidade é a mesma durante o
verão na Amazônia ocidental. O que ainda resta de floresta tropical arde
inclemente sob o fogo criminoso. A fumaça tóxica aumenta as doenças
respiratórias em crianças, velhos e nas pessoas com problemas de asma,
bronquite, rinite alérgica e sinusite. Os poucos hospitais, sem nenhuma
estrutura de funcionamento, lotam nesta época do ano. Porto Velho foi
considerada pelo IPC, Índice de Progresso Social, como a capital que tem o pior
ar em todo o país. Mas de quem é a culpa por esta tragédia que assola essa
região todo ano? Rondônia tem 52 prefeitos, 52 vice-prefeitos uns 600
vereadores, tem governador, vice-governador e vários secretários de estado. Por
que ninguém toma providência nesse caos?
O
estado tem 24 deputados estaduais, 8 deputados federais, 3 senadores, vários
juízes, muitos promotores de Justiça, tem desembargadores, 2 Ministérios
Públicos, tem um Tribunal de Justiça, tem Corpo de Bombeiros, Polícia Militar,
Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal, tem quartéis do Exército, tem Base
Aérea, tem Marinha do Brasil, tem Polícia Federal. Além do mais, o governo
federal tem Lula como presidente do país e Geraldo Alckmin como vice. Tem pelo
menos 37 ministérios, dentre eles, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do
Clima sob a responsabilidade da acreana e amazônida Marina Silva. Existe ainda
o S.T.F e vários outros tribunais no país. Mas a fumaça teima em aparecer todo
ano por aqui. Esse absurdo é, claro, a consequência maior de quem toca fogo
nesse bioma, que está em vias de extinção. Pior do que a agonia é o silêncio de
todos.
A
fumaça da Amazônia e também do Pantanal “viaja” e já está chegando às
regiões mais ao sul do país e com certeza poderá provocar, dentro de pouco
tempo, desastres ambientais catastróficos como o ocorrido em maio último no Rio
Grande do Sul. A fumaça daqui bloqueia as nuvens de chuva, que castigam sem dó
as populações afetadas. Além do mais, satélites internacionais captam os focos
de incêndio no que ainda resta de floresta tropical no Brasil. Mais uma
vergonha para o nosso país perante as autoridades do mundo inteiro. Mas ninguém
tem culpa pela fumaça criminosa e assassina que presenciamos todo dia em Porto
Velho. Culpar o ex-presidente Jair Bolsonaro não cola mais. Embora ele tenha
incentivado incêndios na Amazônia, está há quase dois anos fora do poder e
esperando, quem sabe, o dia em que será preso pelo mal que fez ao Brasil.
Estamos
bem próximos de mais uma campanha eleitoral e os 21 vereadores de Porto Velho,
por exemplo, sequer falam dessa “Hiroxima do descaso” que
bate a nossa porta e contamina os nossos pulmões. Nem eles nem os outros
centenas de candidatos. Alguns até já falam mentirosamente em melhorar a
qualidade de vida do porto-velhense, mas não veem nessa fumaça um dos fatores
que precisa ser atacado e exterminado. Parece que o fogo e o ar empesteado com
a espessa fuligem são sempre um problema dos outros, embora cada um de nós os
respire a cada instante. Surreal: uma tragédia humanitária visível, mas que não
tem culpados. E nem precisa dizer que em Rondônia tem Ibama, Secretarias de
Meio Ambiente e outros órgãos de “defesa da natureza”. Já sei: o único
culpado deve ser eu, o Professor Nazareno, pois sou a única e
solitária voz que em nome da minha rinite alérgica e da asma do meu filho, faço
como João Batista: prego no deserto.
*Foi Professor em Porto
Velho.
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