E
Rondônia foi privatizada
Professor
Nazareno*
O
jovem estado de Rondônia é uma espécie de “aborto da natureza”.
Não tem nem nunca teve importância nenhuma na já caótica e triste realidade
nacional. O número de habitantes nas suas principais cidades só diminui a cada
dia. A diáspora rondoniana é sentida principalmente em sua capital, Porto
Velho. Esse Estado foi resultado de um dos maiores desastres ambientais da
história da Humanidade e hoje está em franca e visível decadência. Talvez por
isso ou em consequência disso, resolveu-se de uma hora para outra privatizar
tudo o que existe por aqui. Desde praças e monumentos até as belezas naturais
como, por exemplo o rio Madeira. O velho “rio das Madeiras” não só foi
privatizado, mas praticamente morto pela ambição humana. Fincaram-lhe duas
hidrelétricas no seu já assoreado leito e o resultado prático é que nem mais
madeiras em seu curso ele tem mais.
Privatizado,
assoreado e sem peixes, o velho Madeira agoniza a cada ano e sua morte já é
quase certa. Este ano de 2024 vai secar tanto que em alguns trechos ficará
difícil até para se navegar de canoa. Mas a sanha privatista e perversa não
parou por aí. O agronegócio pode ser o maior responsável pelas queimadas que se
verificam no estado todo ano no verão amazônico. A floresta arde em chamas para
dar passagem a mais produção de commodities. A fumaça sufocante e tóxica invade
os estados de outras regiões denunciando o pouco caso que Rondônia tem com o já
combalido meio ambiente. Durante todo o mês de agosto, Porto Velho teve o pior
ar do Brasil para se respirar. Os poucos hospitais se encheram de velhos e de
crianças com problemas respiratórios. “É o progresso em Rondônia”, dizem
os mais desinformados. Mas o sofrimento atinge a todos.
Privatizaram
também a antiga Ceron, Centrais Elétricas de Rondônia, por um preço ínfimo, mas
os benefícios ainda não apareceram para ninguém. Como esquecer o apagão do dia
22 de agosto último? Estão querendo privatizar a Caerd, Companhia de Água e
Esgotos de Rondônia. Só que a bola da vez foi a EFMM, a lendária e histórica Estrada
de Ferro Madeira-Mamoré. Dizem que a velha “Ferrovia do Diabo” pertence
ao povo de Rondônia. Mentira! Se você quiser visitar o museu tem que pagar pelo
menos 33 reais. Muito caro e até inadmissível. Para se visitar o Museu do
Louvre em Paris paga-se somente 17 euros. Só que o salário mínimo francês é de
quase 1.600 euros e aqui no Brasil não passa de 1.412 reais. Além do mais o
Louvre é visitado por pessoas do mundo inteiro, enquanto a EFMM... Mas ambos
têm a sua importância. O Louvre superado pela EFMM?
O poder público é
que deveria custear a EFMM e seu museu, dada a relevância deles para Rondônia, para
os rondonienses e principalmente para os porto-velhenses. Embora estejamos
cansados de ver trilhos espalhados pela cidade de Porto Velho servindo de
proteção para algumas casas e comércios. Vimos também as águas do rio Madeira
invadirem lentamente os galpões históricos na grande enchente de 2014. Talvez
por isso, resolveram “vender” o maior e mais importante ponto histórico
e turístico daqui. Cobrar 10 reais a título de manutenção já seria algo muito incomum.
Ainda assim, duvido que muita gente se interessasse em visitá-lo. E não tem que
privatizar nada. O poder público tem competência suficiente para administrar
sua própria história. Se privatizar fosse bom, o “Built to Suit”
do governador Marcos Rocha teria dado certo e a velha EFMM estaria com
multidões na sua porta. Fato: “Quando tudo for privado, seremos privados
de tudo”.
*Foi Professor em Porto
Velho.
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