domingo, 30 de julho de 2017

Eu tenho Alzheimer



Eu tenho Alzheimer

Professor Nazareno*

            O mal de Alzheimer é uma doença muito grave que faz as pessoas perderem a memória. Na maioria dos casos, a partir dos 60 anos de idade, embora haja registros de cidadãos acometidos pela patologia muito antes desse limite. O sofrimento é muito grande e até preocupante, principalmente para familiares e amigos. No Brasil, parece que grande parte dos cidadãos sofre deste terrível mal sem nem saber. Memória é coisa rara entre muitos de nós brasileiros. Na área da política e da participação social, por exemplo, é onde mais se verifica esse inconveniente. Uma parte muito grande dos mais de 206 milhões de cidadãos deste país sofre disso e nunca procurou ajuda para sanar seus problemas. Recentemente descobri que também sofro desta patologia, embora lute sem tréguas para me livrar do incômodo. Por isso, leio, reflito e pesquiso diariamente.
            Minha memória se foi já faz tempo. Talvez por isso, vivo gritando aos quatro cantos que quero Jair Bolsonaro eleito presidente do Brasil, pois ele vai representar a elite fardada e todos os anseios conservadores e reacionários. Quero intransigentemente a volta dos militares para nos governar, mesmo que a conjuntura política internacional não aceite mais este regime. Nem lembrei que o golpe dado por eles em 1964 foi urdido dentro dos quartéis só para proteger a elite e os ricos. Nem vou me recordar de que se os “milicos” tivessem sido mesmo tão bons não teriam se retirado, por vontade própria, da vida política nacional em 1985. Seria bom lembrar-se também da censura, da falta de democracia, das perseguições, dos exílios, da tortura, dos assassinatos, do DOI-CODI, da corrupção encoberta pela falta de liberdades e pelo enriquecimento de poucos.
            Por causa da doença, recentemente vesti a camisa amarela da CBF, saí às ruas, bati panelas, adorei o pato da FIESP, aplaudi o golpe contra a Dilma e o PT, apoiei alegremente deputados federais, me confraternizei com senadores e defendi a família tradicional brasileira. O Alzheimer não me deixa ver também que “políticos que não são políticos” tiram férias apenas com seis meses de trabalho e nada acontece com eles. Não consigo ver aumentos imorais de impostos, aumento da gasolina, da conta de energia e de tantos outros bens só para arrecadar verbas com o objetivo de comprar voto e apoio de políticos para afastar de vez a denúncia contra o presidente da República, vergonhosamente acusado de corrupção e outros desmandos. Só consigo ver que Michel Temer, com menos de cinco por cento de apoio popular, é uma dádiva para o Brasil.
            Se não for o mal de Alzheimer, eu não sei qual é o meu problema. Deve ser sonífero ou outra droga que colocam na água que bebemos. Não participo mais da política nem quero participar e, acomodado nas redes sociais, vejo tomarem todas as decisões e nada falo. Meu filho perdeu a bolsa na universidade, muitos de meus amigos perderam seus empregos, virei empregado terceirizado, abandonei o meu plano de saúde, ultimamente só ando de ônibus apesar do aumento nas passagens, nunca mais viajei de férias e sei que a vida está pior nos últimos anos, mas estranhamente continuo feliz e acho que é melhor assim, pois nossa bandeira nunca será vermelha. Embora com todos esses fatos, acredito que a vida vai melhorar. Lula, Bolsonaro, Marina Silva, Ciro Gomes, João Doria, Aécio Neves e tantos outros bons nomes que representam o novo é o que nos dá tantas esperanças. Ainda bem que leio a Veja e assisto à Globo todo dia.



*É Professor em Porto Velho.

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Bolsonaro na cabeça


Bolsonaro na cabeça

Professor Nazareno*

            O Brasil passa de novo por algumas dificuldades. Na política vivemos o Armagedon. E como esta é a mais importante das ciências, claro que as outras áreas podem também ser afetadas pelo caos. Podem, mas não serão. O fim do suplício dos brasileiros já tem nome e data. Jair Messias Bolsonaro pode ser eleito o novo presidente do país a partir de 2018. Bolsonaro é o tipo de político “que também não é político” e por isso encanta grande parte do eleitorado brasileiro. Militar da reserva do Exército e deputado federal já pela sexta vez, o mais novo líder desponta nas pesquisas de opinião como presença certa e talvez até vitoriosa no segundo turno das próximas eleições. Com um discurso messiânico e afiado, “Bolsomito” encanta multidões por onde passa: jovens principalmente e também os velhos saudosistas dos “áureos tempos” entre 1964 e 1985.
            No poder, certamente ele reconduzirá o Brasil para a modernidade e as nações mais ricas e prósperas do mundo ficarão com inveja do nosso país. Internamente haverá uma verdadeira revolução nos costumes e nas práticas cotidianas. Muitas coisas do “melhor período da nossa História” voltarão a ser realidade. Bolsonaro recriará o DOI-CODI para a euforia geral. Esquerdistas inconsequentes não terão vez nem voz com ele. Opiniões todos terão, mas só com responsabilidade e altivez. Em todas as unidades da federação haverá escritórios e fiscais que acompanharão os passos de todos. É o Estado preocupado com o bem estar do cidadão comum, coisa tão boa, mas que há mais de três décadas não acontece. Televisão, sites e a mídia de um modo geral serão orientados para participarem do crescimento do país e para respeitar os novos métodos implantados.
            Na área da segurança pública não haverá mais violência, pois será criado o Ministério da Justiça com as Próprias Mãos. E como o brasileiro comum entende muito bem de leis e de Direitos Humanos essa nova pasta será um sucesso. Na Educação, todas as escolas serão militarizadas. O pioneiro e bravo exemplo de Rondônia será levado para todo o país. Acho que nosso Estado terá representante na Esplanada dos Ministérios. Usar fardamento e cantar o hino nacional diariamente elevará o nível das nossas escolas e dos nossos alunos. Além do mais, como os militares já resolveram o problema da violência, nada mais louvável do que responderem também pela Educação. O Conselho Nacional dos Direitos Humanos será, claro, extinto. O comunismo será crime e o país voltará a ter a Lei de Segurança Nacional e os bons Atos Institucionais.
Na Saúde, Rondônia proporá a ele a “joãopaulinização” de todos os hospitais e clínicas do país, já que o modelo por aqui sempre deu certo para todos os cidadãos, principalmente aqueles mais pobres e carentes. O nosso novo presidente terá um blog e a cada seis meses viajará para a Europa de férias, já que ninguém é de ferro. E tudo com a aprovação dos políticos mais chegados. Para alegria de muitos, a Constituição será substituída pela Bíblia e os homossexuais, LGBT e afins serão proibidos de existir. O Estado não mais será laico e poetas, professores, blogueiros e intelectuais poderão sofrer “pequenas restrições” em suas atividades. Para o bem de todos, greves não mais existirão e todas as passeatas e manifestações serão devidamente controladas pelo Poder Público. O Judiciário ainda existirá, mas será igual àquele das décadas de 60 e 70. Lava Jato só para lavar carros mesmo. Ele “prenderá e arrebentará” quem não votar nele?




*É Professor em Porto Velho.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Leo, guerreiro amazônico


Leo, guerreiro amazônico


Professor Nazareno*


Nascido há 62 anos na Ilha de Assunção no baixo Madeira em Porto Velho, filho de um antigo soldado da borracha e de uma descendente de cearenses, Manoel Pereira Neto quase não era conhecido nas redes sociais nem nas “altas rodas” da cidade que o acolheu a partir do ano 1980. Mas tinha muitos amigos e admiradores. Leo, ou Cabo Leo, era um autêntico rondoniense que se orgulhava da sua humilde origem beiradeira e de seus jeitos e astúcias em cima de um trator da prefeitura da capital onde trabalhou por mais de 30 anos abrindo e encascalhando ruas e avenidas. Garoto pobre do interior, Cabo Leo já fez de tudo na vida para sobreviver e criar sua família com muita dignidade e caráter. Sempre alegre e tranquilo, foi gari, garçom no antigo Jaú, prático de barco, pescador, caçador e um mateiro dos bons. Leo morreu, mas poucos souberam disso.
Como ninguém, o Cabo Leo sabia andar no meio do mato. Nunca se perdeu e desde pequeno caçava como passatempo. “Eu entro em qualquer mata e saio na hora que eu quiser” costumava dizer. Aprendeu a viver a vida simplesmente vivendo a vida. Ajudou no lazer de muitas autoridades sem nada cobrar. Acampar no mato? Cabo Leo é o guia. Pescar na extinta Cachoeira do Teotônio sempre foi um de seus esportes favoritos. Tarrafear era com ele mesmo. Pescava por prazer e depois doava todo o peixe para os conhecidos que encontrava. “Para casa eu só levo o do almoço”, dizia alegremente. “Peixe no rio Madeira é como uma mina, não acaba nunca”, acreditava piamente. Nunca teve orgulho de ser rondoniense, pois dizia que ninguém escolhe lugar para nascer. “O bom é a gente viver para ajudar os familiares e os amigos”, pregava.
Cabo Leo viu o mar, viajou de avião e não se afobou. Mesmo sendo a primeira vez, se comportou como um veterano. Como beiradeiro que anda em barco pequeno nos perigosos e traiçoeiros banzeiros do Madeira em dias de temporal, não via empecilho nenhum em estar nos céus. Viu o frio de zero grau sem maiores problemas. “Com roupas grossas, frio não tem nenhuma novidade”, acreditava. Só não entendia como há pessoas “tão bestas” que viajam só para curtir essa temperatura de friza (freezer). Garantia que já tinha trabalhado em geleira de um barco pesqueiro entre Porto Velho e Manaus e por isso já estava acostumado ao tempo frio. Perguntado se gostava de sua terra natal ele dizia que Rondônia foi feita só para os ricos. “Se sobrar alguma coisa, eles dão de esmolas para nós os pobres, que não têm vez em lugar nenhum do mundo”.
Sempre operando máquinas, ajudou na abertura da Avenida rio Madeira, hoje Chiquilito Erse, abriu a Jorge Teixeira para ligá-la ao aeroporto, hoje Espaço Alternativo e quando o José Guedes era prefeito de Porto Velho, ajudou na abertura da Zona Leste da cidade. Leo tinha um grande coração e por causa dele veio a óbito. Viu as condições de “campo de concentração” do Hospital João Paulo Segundo onde ficou internado por muitos dias. “Andou” também pelo Hospital de Base e em algumas clínicas particulares. Por causa do diabetes, sabia da morte certa e por isso resolveu, contra tudo e contra todos, “despedir-se” da sua amada Ilha. Com a família, participou pela última vez do festejo de São Pedro onde se divertiu como pôde. Fez covas para enterrar muitos no Tonhão. E acabou enterrado lá. Normal não ter nenhuma autoridade em seu velório. Sua lição ficará e jamais será nome de rua, embora tenha aberto tantas.




*É Professor em Porto Velho.

sábado, 22 de julho de 2017

Sonho: EFMM privatizada


Sonho: EFMM privatizada


Professor Nazareno*

            
       É inegável a importância histórica da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. A Ferrovia do Diabo, concluída no início do século passado, faz parte do acervo histórico da humanidade não só por que trabalhadores de várias nacionalidades participaram da obra, mas principalmente pelo fato de ter sido destaque entre as relações do Brasil com a Bolívia e de ter fechado com “chave de ouro” os áureos tempos do Primeiro Ciclo da borracha. Por sua causa, Porto Velho e Guajará-Mirim existem. O Estado do Acre, a própria Bolívia, o Chile, os Estados Unidos, Barbados, Reino Unido e várias outras nações do mundo estão direta ou indiretamente ligadas ao seu contexto. Porém com pouco mais de cem anos de existência, o que resta da velha ferrovia está abandonado e apodrecendo no meio do mato. Transformada em monturo e ferrugem, agoniza a esmo.
            Os problemas da EFMM foram muitos, mas sua lenta agonia provavelmente começou quando passou a ser administrada por brasileiros e depois pelos rondonienses. Seus trilhos viraram “estacas” de seguranças de residências, suas locomotivas foram desativadas e descartadas como lixo velho, seu patrimônio dilapidado, muitas peças de seu acervo foram roubadas e na enchente histórica em 2014, as águas do rio Madeira lentamente lhe impuseram o tiro de misericórdia sob o olhar passivo e negligente das autoridades que tomavam conta da velharia. Por tudo isso, a Estrada de Ferro mais importante da Amazônia deveria ser privatizada. Um sonho se outras nações ou povos mais zelosos cuidassem dela e de toda a área circunvizinha. O porto do Cai N’água, que está parado há meses, finalmente voltaria a funcionar com os novos administradores.
            Duvido que se alemães, franceses ou japoneses, por exemplo, tivessem a suprema coragem de tomar conta daquelas sucatas podres, a ponte ainda estivesse escura como breu e sem nenhuma serventia. Zelosos como são, os estrangeiros já tinham construído uma pista de caminhada do centro até a hidrelétrica de Santo Antônio para substituir o famigerado Espaço Alternativo. E sem roubar um único centavo da obra. Caminhar com uma vista panorâmica do Madeira e da região seria privilégio para poucos. Os competentes e novos administradores certamente plantariam flores e criariam muitos jardins e recantos de lazer ao longo da beira do rio desde a hidrelétrica até a estrada do Belmont. Tenho certeza absoluta de que sob uma administração de responsabilidade não haveria sequer um só saco plástico, papel ou garrafa pet jogados.
            Festa Gospel ou de qualquer outra natureza ainda haveria no lugar, mas depois não se encontrariam imundícies jogadas no meio da grama. Antes de toda concentração, sacos de lixo seriam distribuídos e fiscais orientariam os participantes a não sujar o espaço público. Além de não saberem administrar nada, brasileiros e rondonienses de um modo geral adoram sujar e emporcalhar o ambiente que os cerca. Segurança haveria de sobra e ninguém ousaria mais defecar nas imediações da praça histórica muito menos usar drogas a céu aberto sem ser importunado pela inexistente segurança. O vergonhoso cemitério de locomotivas seria todo restaurado e colocado em exposição. Se foram os forâneos que construíram a majestosa obra, só mesmo eles com sua organização e honestidade para fazê-la trazer de volta a alegria dos seus poucos visitantes. O que estão esperando? Devolvam logo a Mad Maria e todo acervo da EFMM para os estrangeiros.




*É Professor em Porto Velho.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Frio alheio e extemporâneo


Frio alheio e extemporâneo


Professor Nazareno*


Frio alheio, pois não é daqui. É do Sul do Brasil e de muitos outros lugares civilizados do exterior. Extemporâneo, já que é totalmente fora de época.  E mais uma vez a natureza descontrolada decide nos pregar uma peça mandando frio para este fim de mundo. Embora seja inverno no hemisfério sul da terra, em Rondônia não deveria fazer frio. Sim, 15 ou 16 graus é muito frio para quem vive no mormaço úmido destas latitudes quentes. A forte massa de ar polar que alcançou o sul da Amazônia em meados deste julho, dando origem ao fenômeno conhecido regionalmente como friagem, fez despencar as altas temperaturas da região e trouxe consigo, de novo, algo inédito: a sensação de que em Rondônia e em Porto Velho, sua imunda, quente e inabitável capital vive-se na Europa, nos EUA ou em outro lugar desenvolvido, aprazível e próspero.
Alguns rondonienses hipócritas afirmam aos quatro cantos que adoram este tempo frio e ventilado. “O clima daqui devia ser esse” dizem sem a menor noção do ridículo. Mentira pura. Tudo falsidade. Lorota para fazer média com os idiotas. Já outros falam que amam Porto Velho, mas estranhamente moram em cidades fora daqui. Dizer que adoram o frio, mas não conviver com ele é o mesmo que declarar amor à cidade vivendo em outros lugares bem mais civilizados e atrativos. A realidade do frio em baixas latitudes transforma o que já é ruim em algo bem pior. Nesta época do ano, Porto Velho é uma das filiais do inferno. Calor insuportável, umidade, poeira e fumaça das criminosas queimadas dão o toque diabólico ao ambiente infecto e inóspito em que vivemos.  Até o prefeito da cidade, o “estimado líder”, foi para a Disney e a Europa.
Com frio ou sem frio, Porto Velho é um fim de mundo feito sob medida para quem não tem dinheiro nem condições de ir ao Primeiro Mundo como o nobre alcaide e outros poucos cidadãos privilegiados. Eu já falei uma vez que aqui no falso frio da zona quente da terra somos obrigados a ver o espetáculo dantesco de pessoas usando roupas velhas, rotas, fedendo a mofo, baratas e a naftalina. Porém, muitos porto-velhenses gostam mesmo do frio, pois assim podem sujar mais a sua cidade. Não se sabe o porquê, mas nestes dois ou três dias “friorentos” aumenta a quantidade de papel, garrafas pet, plásticos, absorventes usados e até preservativos deixados no meio das ruas e avenidas. O lixo e a falta de bons modos por aqui campeiam no Arraial Flor de Maracujá, nos shows gospel, na Banda do carnaval e em qualquer solenidade. Com ou sem friagem.
Sem condições sequer para tomar um bom vinho ou até mesmo degustar uma culinária mais selecionada, alguns dos pobres coitados moradores daqui, tremendo de frio, coçando-se todo, tossindo e ainda meio desajeitados com suas roupas doadas se viram como podem no meio da poeira e da sujeira para comemorar alegremente a “imparcial” condenação de Lula na Lava Jato, a absolvição do Aécio Neves e o possível perdão que será dado ao governo Temer e a sua turma. “Esse frio pode ser muito bom também para o cemitério de locomotivas da extinta e abandonada EFMM”, comentam alguns. Realmente: o frio fará a “mãe de Rondônia” durar mais tempo no meio do mato e da ferrugem. Na Câmara de Vereadores de Porto Velho e na Assembleia Legislativa os ânimos se exaltam: “Podemos trazer este frio para ficar por aqui para sempre” já prometem alguns políticos. Chuveiro quente, edredons e banhos voltarão às periferias?



*É Professor em Porto Velho (http://blogdotionaza.blogspot.com
)

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Políticos: os ‘zeróis’ do povo


Políticos: os ‘zeróis’ do povo

Professor Nazareno*

            Em toda sociedade moderna minimamente organizada devem existir os políticos, sim. Eles fazem a ponte, o elo entre essa sociedade, que os escolhe, e o Poder Público. Além disso, criam leis, governam e procuram organizar as ações para a melhoria coletiva. Se for ruim com eles, será muito pior sem eles, pois de que forma um povo, uma nação, um Estado, uma cidade seriam governados? Como se escolheriam os líderes e os governantes? No entanto, os políticos brasileiros já há muito tempo têm desmistificado e negado essa definição e transformaram a importante arte da política na prática de gerenciar seus próprios interesses. E o pior, com a aceitação, a passividade e o consentimento desse mesmo povo. Fazer política no nosso país tem sido sinônimo de enriquecimento muitas vezes ilícito. E o dinheiro público é o combustível para o roubo.
            Muitos dos atuais partidos políticos do Brasil viraram verdadeiras organizações criminosas. Sem nenhuma ideologia e sem a menor vocação para defender os cidadãos mais carentes, seus dirigentes e filiados partiram sem dó nem piedade sobre o dinheiro dos impostos e na certeza da impunidade transformaram a riqueza de uma das maiores potências econômicas da atualidade num patrimônio de poucos. Sem dinheiro disponível, os serviços públicos pioram a cada dia e a qualidade de vida dos brasileiros comuns definha assustadoramente. E tudo isso com a estranha cumplicidade desse povo necessitado. É como se nós sofrêssemos da Síndrome de Estocolmo em relação aos nossos governantes. Somos como hienas covardes que nos satisfazemos e rimos quando nos deixam comer carne podre. Como galinhas, só cantamos após botar um grande ovo.
Os nossos políticos fazem “gato e sapato” de nós e não reagimos nunca. Retiram nossos direitos, nos humilham e nada nos repassam. Acuados, bradamos que a política não nos interessa. E não nos enganemos: a maioria dos eleitores brasileiros e rondonienses não tem leitura de mundo nem conhecimentos necessários para se opor a esses políticos canalhas. Nas próximas eleições, TODOS (ou quase todos) os traidores desse mesmo eleitor serão novamente reconduzidos aos cargos que hoje ocupam. Por ignorância, comodismo ou burrice mesmo, o culpado de todas as mazelas do povo brasileiro é esse mesmo povo. Somos uma nação onde se acredita que apenas uns 20% dos eleitores têm algum tipo de consciência de sua própria existência. Uma nação de idiotas e semianalfabetos que por estupidez ajudam a perpetuar a exploração coletiva.
Diego Mainardi disse que o Brasil não tem políticos de direita nem de esquerda. “Tem um bando de salafrários que se reúnem para roubar juntos”. Muitos deles fazem ou aprovam as suas próprias leis. Hildon Chaves, por exemplo, atual prefeito de Porto Velho decidiu visitar o Primeiro Mundo com apenas seis meses de mandato e para isso teve a devida aprovação da “amiga” Câmara de Vereadores. Em pleno arraial Flor do Maracujá, decidiu implementar o turismo em Paris e na Disney quando podia ter ido a Bandeirantes, Jaci, Calama ou outro distrito carente da capital. O “estimado líder” aumentou em 26% as passagens de ônibus e deixou um político citado em corrupção no seu lugar. E por tudo isso foi aplaudido. A atual situação caótica na política deste país pode atingir apenas uns 10% desses maus políticos. Sem nenhuma visão política, continuaremos sendo governados e administrados por essa gente ainda por muito tempo.




*É Professor em Porto Velho.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Entrevista com o Diabo


Entrevista com o Diabo


Professor Nazareno*


Fiz uma entrevista com o Cão. Isso mesmo. Com o chefe do inferno. Passava da meia noite quando cheguei ao local marcado. A catinga de enxofre e lama podre tomava conta do ambiente. Havia muita sujeira, mofo, umidade e lodo, mas já acostumado à falta de saneamento básico e de esgoto me senti em casa. E até que não fazia muito calor levando em consideração o mormaço em que vivo. Por causa da fama (da má fama) do entrevistado, eu estava tenso. Na hora marcada, eis que aparece o Capeta com a sua esposa, suas duas amantes, seu namorado e vários guarda-costas travestidos de anjos. Quando me viu, o peste foi logo perguntando pela sua ferrovia. “Estão cuidando bem do meu patrimônio?”, perguntou. Disse-lhe que sim e que estava dando muito lucro para a cidade. Ele tem ferrovia, ponte, viadutos, Espaço Alternativo, ruas e avenidas.
            Ele me confidenciou que gostava muito do meu lugar, mas era o povo dali que mais o encantava. “A sua cidade é um endereço muito bom e aprazível porque tudo nele lembra a minha casa”, disse Lúcifer. Tentei em vão lhe dizer que o povo parece anestesiado, enganado e abestado, pois continua elegendo, em todas as eleições, as tranqueiras de sempre. “Tem problema, não! Isso faz parte do acordo que tenho com eles”, afirmou, para o meu espanto. A Câmara de Vereadores da cidade deve ser um exemplo disso, imaginei. Acho que a composição da Assembleia Legislativa é a mesma coisa também. Depois que eu estava mais calmo, ele me falou que no inferno é normal todos os funcionários tirarem férias após cinco ou seis meses de trabalho fictício e que todos os legisladores e ele próprio aprovam isso para a felicidade geral dos governados.
            Ainda meio trêmulo, perguntei-lhe se os políticos do “Mármore Quente” roubam e enganam também o povo dali. “Claro que sim! E é normal!”, disse-me o Chifrudo. E continuou: “roubar e tomar o dinheiro dos impostos pagos pelos otários foi algo inventado neste ambiente”. Aí pensei: deve ser por isso que ninguém diz nada e ainda defende com unhas e dentes os ladrões. Aplaudir corruptos, só nas profundezas mesmo. “O povo do seu município é uma gente que é muito admirada aqui no inferno, pois sempre viveu na merda, mas alegre e feliz de nada reclama”, afirmou o Coisa Ruim. Então eu lembrei: é esse mesmo povo que chama bosta de perfume na esperança de que as fezes algum dia exalem cheiro de flores, de Chanel 5. Ser governado por corruptos, demagogos, mentirosos e denunciados por roubalheira é um orgulho ainda para muitos.
Falei-lhe sobre a crítica situação política do Brasil atual e ele, após retocar a maquiagem, os brincos e trocar de calcinha pela décima vez durante a entrevista, falou-me que os políticos estão todos certos e o povo que “bateu panelas e se vestiu de amarelo” é que devia se envergonhar. Gritei bem alto: “Meu Deus! Então o senhor está certo”. Fui repreendido que se falasse de novo naquele nome proibido, a entrevista seria encerrada. “Não fale o nome do inimigo!”. Acho que fui displicente no momento e pedi desculpas. “Fale-me de Aécio, de Lula, de Dilma, de Sérgio Moro, de Cunha, de Temer, de Jucá, Moreira Franco, Joesley ou de qualquer um Boi que eu fico alegre e feliz.” O Cramunhão confidenciou que nunca perdeu o Arraial Flor do Maracujá nem nenhuma outra manifestação dita de cultura numa das mais atrasadas e bregas províncias do país. Finda a conversa, todos sumiram no meio de muita poeira. E eu acordei na Zona Leste.




*É Professor em Porto Velho.

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Obrigado, Dr. Hildon!


Obrigado, Dr. Hildon!


Professor Nazareno*

           
Porto Velho, a capital de Roraima, é uma cidade de muita sorte. Em 2016 uns 150 mil eleitores escolheram o Dr. Hildon Chaves do PSDB para ser seu novo prefeito. Homem íntegro, inteligente, honesto, trabalhador e líder supremo, o novo alcaide aboliu seu próprio salário e se cercou de outros homens igualmente honestos e inteligentes para melhor administrar a tão sofrida capital dos “destemidos pioneiros”. À frente do município há exatos seis meses, a cabeça desse ex-promotor é uma verdadeira usina de ideias urbanísticas e de soluções fantásticas. Neste tão curto período de tempo, a nossa capital sofreu uma verdadeira revolução urbana. Pereira Passos do Rio de Janeiro e Jaime Lerner de Curitiba têm agora no seu seleto clube de grandes arquitetos mais um integrante. Nem Alckmin nem Doria, o PSDB tem agora o Dr. Hildon para presidente.
A partir de 2017, Porto Velho melhorou em tudo. Só não vê quem não quer. Ele revolucionou a mobilidade urbana, limpou completamente o lixo da cidade e contratou “contadores de buracos no asfalto” (dizem que já tapou mais de três mil em menos de seis meses). Ao melhorar o transporte urbano em mais de 200%, ele foi extremamente humilde e concedeu “somente” 26% de aumento nas passagens urbanas. Esta cidade nunca teve ônibus tão pontuais, modernos e limpos como agora. Em breve a frota será triplicada e deve ser por isso que o UBER está sendo descartado. Hildon Chaves e seus assessores são gênios. O povo está feliz, rindo à toa. Nas redes sociais não se fala de outra coisa. O “prefeito sem salário” revolucionou a educação do município e se mostrou também ser um grande amigo dos camelôs e dos vendedores ambulantes.
Com todas essas credenciais e serviços já prestados aos porto-velhenses ele, de forma mais do que justa, quer viajar para o exterior, mesmo que esteja trabalhando a menos de um ano no seu novo emprego. A Câmara de Vereadores deverá permitir que ele vá para Disney e Paris. No Primeiro Mundo, Hildon Chaves vai ensinar aos prefeitos das cidades que visitará, dentre muitas outras coisas, como resolver de forma pacífica e sábia qualquer pendência com servidores públicos. O caso dos quinquênios é exemplo disso. Mas antes de ir para o mundo civilizado e desenvolvido, ele vai beijar e acariciar Porto Velho várias vezes e deixará Edgar do Boi administrando os munícipes. Como ele reconhece um bandido com apenas dois minutos de conversa, seu substituto cumprirá à risca todas as suas determinações para trazer sempre mais felicidades ao nosso povo.
O Dr. Hildon é uma unanimidade por aqui. Do mais humilde ao mais rico cidadão da cidade, todos se alegram e ficam arrepiados ao ouvir falar dele. Há suspeitas inclusive de que foi ele o mentor do novo Espaço Alternativo e do Ginásio Cláudio Coutinho. Com este grande administrador e estadista, épicos jogos de Vôlei, Basquete e Handebol serão rotina em Porto Velho a partir de agora. Os viadutos ele já está terminando com maestria. Sua marca inconfundível pode ser vista em qualquer lugar da cidade. Lama, poeira e fumaça são coisas do passado. Até frio acho que ele nos trará da Europa. Os eleitores já falam abertamente que não o querem apenas como governador, mas como presidente do país. Não me perdoo jamais por não ter votado nele nas últimas eleições. É intrigante, no entanto, para muitas pessoas que ele não tenha um blog para melhor nos administrar. Claro que o Dr. Hildon não é hipócrita, pois nem político ele é.




*É Professor em Porto Velho.

sábado, 1 de julho de 2017

Acovardados no Facebook

Acovardados no Facebook

Professor Nazareno*


Lima Barreto disse certa vez que “o Brasil não tem povo, tem público”. Isso por que nunca tomamos as decisões políticas, nunca participamos efetivamente da política, apenas assistimos passivamente a classe dominante fazer “gato e sapato”, decidir tudo conforme suas conveniências e depois, calados e passivos, aceitamos tranquilamente. As absurdas declarações do escritor nunca estiveram tão atualizadas como agora. Insatisfeita com a ex-presidente Dilma Rousseff, eleita democraticamente com mais de 54 milhões de votos, e pensando em se livrar da cadeia por causa das acusações de corrupção, a classe política dominante se aliou aos setores mais reacionários e conservadores da sociedade e deu um golpe tomando o poder na maior cara de pau. Michel Temer assume prometendo resolver todos os problemas do país, mas fracassou.
Vários ministros e asseclas do novo governo já caíram ou foram denunciados por desmandos ou roubalheiras. Temer é o primeiro presidente do país a ser denunciado por corrupção em pleno exercício do cargo. “O que o Temer fez de lambança já dava para ter cassado umas cinco Dilma”, é o que se afirma. Porém, poucos acreditam que ele sofrerá qualquer tipo de punição. Aécio Neves, senador mineiro pelo PSDB e um dos artífices do golpe, está também enrolado até o pescoço em maracutaias, mas foi recentemente anistiado pelo STF. Como não era petista, não perdeu o mandato e nem foi preso. Rocha Loures, ex-deputado federal e “amigo de confiança” do presidente, foi flagrado e filmado com uma mala de 500 mil reais. Preso por poucos dias, já recebeu seu indulto sob o silêncio covarde de todos os que bateram panelas contra a Dilma.
Martin Luther King, ativista político norte-americano, disse que o que mais o preocupava não era o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética, mas o silêncio dos bons. Os brasileiros continuam calados e acovardados diante da hecatombe política do país. E isso é vergonhoso como disse a jornalista Luciana Oliveira de Porto Velho: “a vergonha não é o STF nem os políticos, a vergonha é o povo brasileiro acovardado”. Ninguém faz nada. Ninguém vai às ruas protestar. Ninguém grita. Só às vezes e no Facebook. Quando se convocam passeatas, apenas alguns “gatos pingados” têm coragem suficiente para se inquietar e gritar. Na Venezuela, onde o presidente Maduro, assim como Michel Temer, luta para não perder a boquinha do poder, muitos venezuelanos já perderam a vida lutando contra o cinismo.
A nossa elite política sempre conspirou contra o povo, que vota nela nas eleições. Deve ser por isso que Lula lidera em todas as pesquisas para ser presidente a partir de 2018. Se não derem um jeitinho de prendê-lo ou tirá-lo de cena, ele governará o país de novo. Nas urnas, bate qualquer um que o encare. E a lógica é clara: “se todos são iguais, pelo menos Lula olhou para os mais pobres”. Até agora, punição, ainda que branda, só para uns, enquanto muitos outros se safam. Se fôssemos um país sério, todos os envolvidas em escândalos de roubo deveriam ser presos, investigados, e se culpados, condenados na forma da lei. Sem prestígio aqui e lá fora, Temer não quer largar o osso. E nós, passivos, aceitamos tudo quietos. “Só num país muito doente, um deputado é flagrado recebendo uma mala de dinheiro e fica solto. Um senador é pego combinando propina e fica em liberdade. E um presidente é gravado em prevaricação e não cai”.




*É Professor em Porto Velho.