quarta-feira, 27 de abril de 2016

...E o “frio” chegou mesmo



...E o “frio” chegou mesmo

Professor Nazareno*

            Frio em Porto Velho é uma coisa muita rara, todos sabemos. Tão raro quanto honestidade e decência na política local ou mesmo limpeza nas nossas imundas ruas. Mas desta vez os prognósticos acertaram em cheio a previsão do tempo. Havia uma semana que não se falava em outra coisa nas redes sociais. Um buraco quente sem eira nem beira, a “capital das sentinelas avançadas” foi, de uma hora para outra, sacudida por uma forte massa de ar polar que fez os termômetros despencaram para uns 25 graus centígrados, muito frio por estas bandas. Acostumados aos rotineiros 40 graus à sombra e uma infernal umidade relativa do ar, os portovelhenses riam à toa como se tivessem acertado a Mega Sena. “Será que vai nevar por aqui também?”. Era a cantilena que se ouvia dos desinformados e tolos cidadãos que nada conhecem de previsão do tempo.
            Friagem na Amazônia em abril é coisa muito difícil mesmo e sendo essa uma Massa Polar Atlântica de forte intensidade faz tudo se parecer com “coisas de outro planeta”. Mas a alegria é compreensível: é a única chance desta capital catinguenta, suja, quente e sem saneamento básico se parecer com uma verdadeira cidade do Primeiro Mundo ou do sul do Brasil, aquelas paradisíacas localidades cheias de flores onde faz frio de verdade no inverno e o clima é agradabilíssimo o resto do ano. No Japão e em alguns países da Europa, por exemplo, nesta época as floridas cerejeiras dão o ar da graça e com sua beleza e aroma característicos cativam os turistas. Aqui, só o Louro Bosta, árvore que espalha sua fedentina no ar empestando ainda mais o que já é fedido por natureza. Numa cidade inóspita onde só há lama e poeira o cenário é surreal.
            Nada mais irritante e chato do que ouvir pessoas fedidas comentando sobre as mudanças da natureza. A naftalina, o mofo e a catinga de barata impregnados em suas rotas e molambentas vestes faz qualquer cidadão engulhar. Matuto no frio é um dantesco e cruel espetáculo. Nem vinho e muito menos bruschettas são consumidos. Só mesmo rinite alérgica, dor de garganta, tosse e muita curuba. As madames da capital por enquanto não poderão comprar seus caros edredons para se exibirem falando da potência de seus aparelhos de ar condicionado. Muitos podem até pensar que isto é obra do PMDB e do novo governo que se avizinha em nosso país. A “ponte para o futuro” é uma coisa tão boa que até o tempo em Rondônia mudou para melhor. Durante a friagem muitos políticos inexplicavelmente recebem elogios. Hoje, quase todos seriam reeleitos.
            As obras do Espaço Alternativo serão retomadas, pasmem! A ponte escura do Madeira poderá ser iluminada e se dermos sorte, até os viadutos do PT serão concluídos. O “frio” em Porto Velho é como o impeachment: é rápido, popular e vem para mudar tudo. E não se sabe o porquê. Até a conhecida e badalada Banda Versace pode compor novas canções, afinal não é sempre que convivemos com temperaturas “tão baixas” como agora. Este inusitado tempo podia impulsionar o nosso inexistente turismo. Livre do calor sufocante e da alta umidade relativa do ar, que voltarão em breve, o problema é o vento soprando nos esgotos que correm a céu aberto. E se o clima de Rondônia fosse assim “sempre frio” como muitos querem? Difícil, pois tudo teria que mudar também. E como conseguiríamos conviver com políticos honestos, ar puro, flores, limpeza, arborização, saneamento, água tratada, educação e saúde de qualidade?




*É Professor em Porto Velho.

domingo, 24 de abril de 2016

Cenas raras no aeroporto



Cenas raras no aeroporto


Professor Nazareno*



     O aeroporto “internacional” Governador Jorge Teixeira de Oliveira de Porto Velho, Rondônia, que de internacional não tem absolutamente nada, já que não faz nem nunca fez um único voo para fora do país, foi palco na sexta-feira, dia 22 de abril de 2016, de cenas extremamente raras. Foram acontecimentos tão difíceis e improváveis de acontecer, principalmente nestes tempos bicudos que vivemos no Brasil, que mais se pareciam com cenas de filmes de ficção, daqueles raríssimos que só se veem nos cinemas e televisões. Uma multidão de alunos e alunas, todas jovens bonitas, arrumadas e também garotos “sarados” gritando euforicamente o nome de alguém. Eram alunos do colégio João Bento da Costa de Porto Velho recepcionando o professor de Matemática Saulo Boni de Campinas, que estava chegando para dar um aulão para todos eles.
            Desnecessário e já repetitivo falar sobre o grande sucesso do Projeto Terceirão que funciona na referida escola. No último ENEM, por exemplo, mais de 500 alunos daquele estabelecimento de ensino da zona sul de Porto Velho ingressaram em várias universidades, públicas e particulares, espalhadas pelo país afora nos mais variados e concorridos cursos superiores. “As apostas para 2016 não são pequenas”, afirmam em uníssono os professores que integram o referido projeto. Por isso, a vinda do renomado professor Saulo Boni para ajudar no processo de formação dos mais de 600 alunos dos terceiros anos. “Matemática no Krú da vida” foi o curso ministrado pelo mestre campineiro. Nada mais salutar e adequado para uma cidade que mais se parece com o “Krú do mundo”.  Por isso, as raras cenas no aeroporto foram dignas de outro planeta.
            Intrigadas, as poucas pessoas presentes ao aeroporto perguntavam atônitas quem era o “cantor de pagode” que aqueles jovens alegres e sorridentes estavam esperando. Outros incautos, movidos ainda pela curiosidade e pela incredulidade, perguntavam o nome do artista famoso ou do jogador de futebol que podia estar desembarcado em nosso acanhado “campo de pouso”. Muitos balançavam a cabeça como em sinal de desaprovação quando descobriam que se tratava de um professor, e de Matemática, que estava tendo aquela calorosa recepção e que os alunos eram todos de uma escola pública da periferia de uma cidade periférica de um Estado da periferia do Brasil, um país que pertence à periferia do mundo civilizado. As pessoas ali estavam mais espantadas do que “galinha quando vê cobra”. Em terra de pouca cultura, tudo é motivo de assombro.
Para a alegria e o delírio daquela moçada, o jovem professor deu um show de aula. Inicialmente no auditório de uma faculdade particular, depois o “raro e grandioso espetáculo de eloquência, conhecimento e sapiência” continuou nas imundas, desarrumadas e fedidas salas de aula da própria escola JBC. A professora Layde Nascimento, mãe da ideia de trazer “novas cabeças” para cá, estava eufórica. Os alunos tiveram “paitrocínio” para bancar um evento que nenhuma das boas escolas particulares daqui faz. Nem o próprio Estado se preocupa em dar uma educação de qualidade para seus pupilos. Jogados em escolas sujas, violentas e de turno único, nossos estudantes são mais vítimas do que protagonistas de uma educação de péssima qualidade que lhes é oferecida. Ainda bem que o mestre não pediu para ver nossos pontos turísticos. Ruínas de obras eleitoreiras, sujeira, lixo, ignorância e descaso não combinam com Sapiência.



*É Professor em Porto Velho.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

Impeachment anistiará corruptos




Impeachment anistiará corruptos

Professor Nazareno*

            O processo de impeachment ou golpe parlamentar que o PT, Partido dos Trabalhadores, e a presidente eleita do Brasil sofreram no dia 17 de abril último serviu, dentre outras coisas, para que os brasileiros comuns passassem a se interessar mais pela política, “a mais importante dentre todas as ciências” segundo o filósofo Aristóteles. Mas só por enquanto, infelizmente. Se a comoção que arrebatou milhões de cidadãos continuasse, certamente este não seria o último encontro dos deputados federais, mas o primeiro de uma enorme série para limpar o Brasil do mal da corrupção e da roubalheira que se entranhou em todos os setores da vida nacional. Se assim não for e as coisas esfriarem, fica então caracterizado que o objetivo das forças reacionárias era tão somente tirar a Dilma e o PT do poder, assim se caracterizando como um golpe mesmo.
            Difícil pensar diferente: a maioria dos deputados que votou favoravelmente à saída da presidente está envolvida em corrupção e toda sorte de delitos. O deputado Eduardo Cunha, que comandou todo o rito, encabeça a lista de corruptos, já responde a vários processos no STF e pode até não sair: já há deputados falando que “o excelente trabalho” capitaneado por ele o credencia para ser anistiado naquela casa de leis. Sai Dilma e o PT, entra Michel Temer, Cunha, o PMDB, o PSDB e mais uma infinidade de pequenos partidos que deram apoio ao golpe. Segundo Ciro Gomes, ex-governador do Ceará, “se o impeachment passasse, uma coalizão de bandidos assumiria o poder no Brasil”. Dilma e a sua turma tinham mesmo que sair, não havia a menor dúvida, mas o pior de toda essa bandalheira é “ter trocado seis por meia dúzia” e voltarmos ao zero.
            O desgoverno do PT arruinou o Brasil, é verdade. Mas os novos mandatários do país não farão jorrar mel e leite das ruas. O país agora na era Temer e Cunha não será certamente um paraíso com coelhinhos saltitantes e borboletas azuis nem terá a panaceia milagreira que resolverá todos os nossos problemas. E quem se vestiu com as cores da seleção nacional de futebol e foi às ruas apoiar a derrubada da presidente eleita pode ter que ficar com o MICO: participou e deu apoio, junto com muitos políticos ladrões e desonestos, a um golpe arquitetado só para anistiar corruptos, canalhas e bandidos. O nível vergonhoso e deprimente dos debates entre os “representantes do povo brasileiro” indica claramente que a farra com o dinheiro público vai continuar. E agora com menos punição ainda. Mas “ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão”, tudo é valido.
            O dia 17 de abril de 2016 pode entrar para a nossa História como o 31 de março de 1964 só que agora com o apoio e a aceitação de risonhos jovens vestidos de verde e amarelo. Aliás, adoradores da ditadura militar e de notórios torturadores não faltaram ao triste espetáculo. Jair Bolsonaro, deputado ultradireitista e um dos apoiadores daquela indecência golpista, dobrou suas intenções de votos para as próximas eleições presidenciais. A bancada BBB (Boi, Bala e Bíblia) angariou mais simpatizantes pelo país. Durante o espetáculo da direita, não faltaram loas e elogios a militares torturadores como o coronel Brilhante Ustra. Passada a festa conservadora, resta saber se a Operação Lava Jato continuará com a mesma disposição de antes para colocar ladrões do dinheiro público atrás das grades. Quando “Deus, torturadores e parentes de deputados” derrubam uma presidente é sinal de que muita coisa ainda tem que mudar na política.




*É Professor em Porto Velho.

domingo, 17 de abril de 2016

E agora, Brasil?



E agora, Brasil?

Professor Nazareno*

         Não vou negar: entre um gole de cerveja e outro, vibrei intensamente com a queda da presidente Dilma Rousseff. Da mesma maneira como fiz quando o Fernando Collor foi escorraçado de Brasília há quase 25 anos. A saída da primeira mulher eleita presidente do nosso país, assim como a do PT, o agora corrupto e ineficiente Partido dos Trabalhadores, trouxe certo alívio e muitas esperanças para quem está na sofrência com tanta crise, inflação, incompetência, desmandos, falta de governabilidade e corrupção. Mas ao mesmo tempo um frio esquisito e perturbador me corre o corpo quando vejo que os seus sucessores, Michel Temer e Eduardo Cunha, não reúnem as mínimas condições morais e éticas para tirar o Brasil do enorme buraco de lama que os políticos, e todos nós eleitores, o colocamos repetidamente nas últimas quatro eleições presidenciais.
A alegria daquele minuto decisivo foi interrompida pela volta à dura realidade. O processo de impeachment, ou mesmo golpe, contra um governo democraticamente eleito com a bagatela de mais de 54 milhões de votos ensejará certamente reações desagradáveis. Além do mais, os milhões de brasileiros favoráveis à queda da presidente podem ter sido enganados mais uma vez segundo o Deputado Federal Alessandro Molon (Rede/RJ), “se esse processo tivesse algo a ver com combater a corrupção, não seria comandado por Eduardo Cunha. Ele é réu no STF em vários processos por lavagem de dinheiro”. Resumindo: disseram aos tolos brasileiros que a saída da Dilma e do corrupto PT do poder era o primeiro passo para colocar o país no rumo certo e saindo toda a “quadrilha” do Planalto, os novos mandatários fariam jorrar mel e leite das ruas.
O novo governo não será a panaceia milagreira que resolverá os problemas do Brasil. O processo de afastamento da presidente Dilma tem que ser só o começo de uma árdua e constante luta que pode levar anos. Impeachment ou golpe não interessa, o PT mereceu sair do governo. Roubou, mentiu e prevaricou como ninguém. Fez tudo o que dizia que ia combater. Enganou os milhões de eleitores e fez como os conservadores da Direita. Por isso, não tinha a menor condição, ética nem moral, para continuar nos governando. Mas a chapa golpista Temer e Eduardo Cunha tem algum resquício de moralidade e honestidade? A maioria dos políticos brasileiros infelizmente é composta por ladrões, canalhas, escroques, corruptos, achacadores e toda a sorte de banditismo que há. Só que todos eles são colocados lá por nós eleitores a cada eleição que acontece.
A batalha não pode se encerrar com este processo de impeachment. Ela é só o início de uma longa jornada que vai limpar o Brasil destes maus políticos. Se Michel Temer, que assume o poder, não for investigado também pelas suas pedaladas fiscais e erros, assim como nada acontecer a Eduardo Cunha e ao PMDB, fica configurado o golpe e não processo legal de impeachment. A Operação Lava Jato, por exemplo, não pode acabar de uma hora para outra. Tem que ir até o fim “doa a quem doer”. Dura Lex, sede Lex! Porém, toda essa “barafunda” pode ter sido uma jogada da Direita, envolvida até o pescoço em roubo e maracutaias, para se safar de possíveis futuras punições. O ex-presidente Lula, se for comprovada a sua culpa, deve responder por todos os seus erros. Assim como todo e qualquer político. Toda e qualquer autoridade. Todo e qualquer cidadão. Se for para mudar, que se mude a política e o Brasil. E não só a Dilma e o PT.




*É Professor em Porto Velho.