A alegria dos
incendiários
Professor Nazareno*
Assim
é o estado de Rondônia. O fogo intenso neste verão amazônico
encobre de fumaça tóxica, mais uma vez, todas as 52 cidades do estado. No
último dia 2 de agosto de 2024 todo o céu do jovem estado estava totalmente encoberto
e “cinza-chumbo”. Porto Velho foi considerada como a capital do país que
tem o pior ar para se respirar. A visibilidade nesse dia não chegava sequer a
50 metros. Prédios encobertos pela fuligem, pessoas tossindo, trânsito
prejudicado, luzes acesas em pleno dia. Mesmo sem voos regulares, o acanhado
aeroporto da cidade ficou fechado e os poucos e raros hospitais da cidade
estavam lotados de velhos e de crianças principalmente. Pessoas com problemas
respiratórios sofriam para encontrar oxigênio na atmosfera. Com temperaturas
diárias superiores aos 40 graus, Porto Velho mostrou por que é chamada a “antessala
do inferno”.
Todo esse caos
contrasta, no entanto, com o hino “Céus de Rondônia”, que além de ser
muito feio, também é mentiroso e com uma letra cheia de hipocrisia e de
enganação. “Azul, nosso céu é sempre azul. Que Deus o mantenha sem rival.
Cristalino muito puro. E o conserve sempre assim”. Joaquim Araújo Lima, o
autor dessa letra hoje mentirosa, talvez não tivesse vivido a realidade de
desastre ambiental que nós vivemos nos dias atuais. Por isso escreveu essas
palavras sem nenhuma dor na consciência. É preciso mudar urgentemente esse hino
e adaptá-lo melhor à realidade de hoje. A criminosa fumaça que tanto incomoda
os rondonienses sempre “viaja” para o sul do Brasil provocando assim um
bloqueio atmosférico que, em tese, é o maior responsável pelas inundações que
ocorreram no Rio Grande do Sul em maio último. Rondônia tem que parar com esse
fogo!
O agronegócio de
Rondônia pode estar por trás de toda essa tragédia. É preciso abrir mais espaço
para as pastagens e para a produção de soja e de outros alimentos, por exemplo.
E o fogo não se manifesta de forma tão espontânea assim. Alguém tem um fósforo
na mão e já sabe perfeitamente que os órgãos “que se dizem de defesa do meio
ambiente” não têm muita competência nem determinação para deter os
incendiários. Os pecuaristas lucram cada vez mais e o povo, que aceita quase
sem nada reclamar, paga o pato. Entre o governo Lula e o governo Bolsonaro, não
se sabe quem mais incendiou a Amazônia. Só que todo esse fogaréu não é de hoje.
O Coronel Jorge Teixeira, um Deus para muitos dos rondonienses, dizia que
fumaça era sinal de progresso. “Estão plantando o futuro”, costumava
dizer quando via fumaça. Até hoje o rondoniense taca fogo em tudo.
Dessa forma, sem
punição e sem sofrer nenhuma consequência aparente por parte do poder público e
também por parte de “órgãos invisíveis”, que deviam defender o meio ambiente,
os grandes pecuaristas e produtores rurais se aliam ao fogo todos os anos. Por
isso, os incendiários se esbaldam na alegria, no prazer, na satisfação e também
na certeza do dinheiro que ganharão exportando as comodities que produzem todo
ano ao custo do sofrimento alheio. E a classe política de Rondônia e de Porto
Velho faz alguma coisa para diminuir esse Armagedon anual? Absolutamente nada.
Até porque muitos desses mesmos políticos representam o agronegócio e muitas
vezes são eles próprios donos de grandes extensões de terra no estado. Porto
Velho tem o pior hospital público do Brasil, tem a pior qualidade de vida
dentre as 27 capitais e agora tem o pior ar para se respirar no país. Você já
viu ou ouviu algum deles mostrar alguma preocupação durante sua campanha
eleitoral?
*Foi Professor em Porto
Velho.
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