sábado, 1 de fevereiro de 2020

O meu amigo chinês


O meu amigo chinês

Professor Nazareno*

            Deng Hua Fong é um amigo meu. Ele é professor na província de Hubei, China, e leciona Mandarim na cidade de Xianning, distante apenas 97 quilômetros de Wuhan. Conheci-o quando estive na Europa no ano passado. Deng sempre quis conhecer a Amazônia. Por isso está hospedado em minha casa aqui mesmo em Porto Velho. Só que ele está um pouco gripado. Ele tosse muito, tem febre e está espirrando. Não estou muito preocupado com a saúde do meu amigo. Disse-lhe que a mudança de temperatura entre os dois países pode ter-lhe custado uma “gripezinha à toa”. Deng está todo feliz e já me disse que gostaria de fazer muitas visitas a órgãos públicos de Porto Velho. Assim que melhorar deste resfriado, pretendo andar com ele pelas ruas e bairros da cidade e, claro, visitar várias coisas desta capital, pois o mesmo está muito curioso com tudo.
            Terei o maior prazer em mostrar ao meu amigo oriental o novo prédio da Assembleia Legislativa de Rondônia ali na antiga Esplanada das Secretarias no encontro das avenidas Calama e Farquar. De preferência assistir com ele a uma das muitas sessões ordinárias daquela casa de leis. Não tem coisa mais prazerosa do que, entre um espirro e outro do meu amigo, observar atentamente aos discursos dos 24 deputados estaduais. Meu amigo ficará mais curioso ainda quando souber quanto custa para Rondônia cada um desses parlamentares. Direi a ele que todos os deputados em um ano equivalem aproximadamente a um novo hospital todo equipado. Não sei qual será a reação dele a todo este descalabro. Talvez mais espirros ainda dentro daquele ambiente também doentio. Deng é um sujeito muito politizado, por isso será normal a sua reação.
E quando ele souber que aqui em Rondônia o Estado e as prefeituras contratam mais funcionários comissionados do que concursados? Lógico que vindo de um país comunista como é a China ele não vai entender muito bem essa prática esquisita daqui. Mas explicarei tudo detalhado a ele: “Deng, o comissionado pode ser demitido a qualquer hora, enquanto o concursado é para a vida toda”. Além do mais, lhe mostrarei que um funcionário comissionado pode se prestar a uma “rachadinha”, prática muito usual no país. Meu medo é que ele espirre ainda mais. Na ponte ainda escura do rio Madeira ele sem dúvida ficará maravilhado quando eu levá-lo lá. Falarei a ele sobre a Energisa e as boas relações que ela tem com o consumidor de Rondônia. O ideal seria fazermos um passeio dentro de um ônibus urbano. Mas isso será impossível.
No Espaço Alternativo da cidade ele certamente ficará encantado com aquela “geringonça imprestável”. E deverá me perguntar para que serve aquilo. Mas legal mesmo será quando eu levar meu amigo chinês à Câmara Municipal de Porto Velho para ver os vereadores “trabalhando” em benefício do povo. Isso em outra sessão também ordinária, claro. Qual será a reação dele quando souber que as crianças da zona rural do município estão há mais de dois anos sem direito à escola por falta de transporte escolar? Tomara que ele não morra de tanto espirrar, pois lhe direi que Porto Velho é uma porcaria, mas tem mais de 20 pré-candidatos querendo ser prefeito. Já pensou na sua reação quando souber o que é auxílio-moradia e para quem é pago? Só não o levo à Banda do Vai Quem Quer porque parece que essa gripe dele está piorando e bem antes do Carnaval ele voltará à China. Já ao famoso “açougue” jamais o levaria.



*Foi Professor em Porto Velho.

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