sexta-feira, 3 de abril de 2020

Uma simples carta a Deus


Uma simples carta a Deus

Professor Nazareno*
               
Outro dia me juraram que o Senhor existia de verdade e que não era apenas uma simples invenção do homem. Não tenho muita certeza disso, mas sempre achei que devido ao desconhecimento de sua origem e de seu previsível fim, os seres humanos entenderam que era bem melhor criar um ser com plenos poderes para lhe guiar bem durante a sua breve passagem por aqui. Sem entender bulhufas da complexidade do cosmos e de suas causas e consequências, foi bom e até mais prático atribuir toda a criação ao Senhor, “que tudo pode, que tudo cria, que tudo sabe, que tudo vê e que tudo decide”. Assim, muito tempo depois do vírus, o Eterno também teria criado o homem, a sua imagem e semelhança, que fique bem claro. O homem e todas as outras coisas que existem. Mas criador e criatura nunca se deram bem. E esta carta é para tirar dúvidas.
O Mestre nos mandou a Peste Negra na Idade Média que ceifou pelo menos 150 milhões de “almas”. Depois nos presenteou com a Gripe Espanhola com uns 75 milhões de óbitos. Permitiu que houvesse guerras e revoluções que destruíram milhões de vidas. Deixou que epidemias, doenças incuráveis, sequelas, pestes e pandemias causassem sofrimento a todos. Por quê? Está o Altíssimo aborrecido com a sua criação? Agora, em pleno século da modernidade, da internet, das grandes viagens, da globalização, assiste meio que acomodado que um simples vírus destrua tudo. Claro que em tempo nenhum nunca seguimos corretamente os seus desejos. Destruímos a natureza sem dó nem piedade. Em Rondônia, por exemplo, destruímos o rio Madeira, incendiamos a floresta todos os anos, não dividimos corretamente a riqueza produzida, sujamos o mundo todo.
Peço desculpas ao Rei dos Reis, mas não posso concordar que o Todo Poderoso também tenha se metido na nossa política. É verdade, Providência, que Jair Bolsonaro foi enviado pelo Criador para governar o Brasil, Hildon Chaves para administrar Porto Velho e Marcos Rocha para “dar as cartas” em Rondônia? Se o Onipotente foi o responsável por isso, lamento dizer: o Senhor “pisou na bola” com os brasileiros e os rondonienses. O Senhor mesmo está vendo. Essas autoridades de araque são muito piores do que o Coronavírus. Crueldade: qual foi a divindade responsável pela envio de Edir Macedo, do “apóstolo” Valdemiro Santiago, do Silas Malafaia (o da rola) e do Pastor R.R Soares para salvar o povo brasileiro? Será o Redentor também o responsável pelo Papa, pelos pastores, padres, cultos e missas? O vírus não respeitou nenhum deles.
Aliás, Gloriosa Divindade, esse terrível e mortal vírus é criação Sua? Se for, por que o criou? O Senhor já matou tantos inocentes na época do dilúvio universal e agora nos dá essa praga? Já há tantos terremotos, vulcões, tsunamis e mesmo doenças comuns. Eu também tenho que pagar pelos erros da Humanidade? Não entendo: eu não gosto de futebol, não gosto do Flamengo, do Carnaval, não vou à igreja, não rezo, não sou escravo da riqueza nem do dinheiro, jamais li a Bíblia, nunca votei em nenhum desses políticos ridículos e raramente vou à Banda do Vai Quem Quer ou ao Arraial Flor do Maracujá. Devia não pagar nada. Mas se não foi criação Sua, destrua-o logo, senão começo a desconfiar de sua onipotência. Sei que o Meu Poderoso Pai vai ler esta humilde cartinha, pois vejo que às vezes sai dos seus inúmeros afazeres para dar carros a tantas pessoas. Dúvida cruel: rezar ajoelhado no meio das ruas mata o vírus? Ou não?



*Foi Professor em Porto Velho.

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