Uma
cidade inacabada
Professor Nazareno*
Comparada a muitas outras cidades
do Brasil como, por exemplo, Londrina e Maringá no Paraná ou Caxias do Sul no
Rio Grande do Sul e que apresentam uma boa estrutura urbana, limpeza e
planejamento urbanístico decente, apesar de serem muito mais jovens, a minha
cidade é velha e acabada. Parece um lugar fantasma. Tem quase um século de
existência, e por isso mesmo é um município quase cem anos. E essa
característica, a ausência do órgão excretor, é vista diariamente em suas sujas
e imundas ruas. Porém, o seu mau cheiro
característico, o trânsito caótico, a desorganização, a falta de saneamento
básico e esgotos, a violência, dentre outras mazelas, estão perdendo espaço
para uma nova e arrojada marca registrada: o acúmulo de obras inacabadas que
campeiam por todos os bairros e ruas. Esse verdadeiro descaso verificado tanto na
área pública quanto na particular enfeia ainda mais a já deplorável paisagem
local.
Como em nenhum outro lugar do
mundo, um Shopping Center abandonado há anos e sem data para ser terminado tem
na minha cidade. Servindo ninguém sabe para quê, está lá ele no meio do mato e
do lixo sendo esconderijo para marginais só que está estrategicamente
localizado bem na porta da frente do meu lugar de morada. Parece até dizendo
para os poucos visitantes que aqui é a terra das obras inacabadas. Como é uma
cidade horizontal, edifícios de apartamentos devem ter uns três ou quatro em
minha cidade. Só que metade deles está ainda por terminar. Ficam esperando
talvez compradores que nunca chegarão. Não tem rodoviária nova na minha cidade,
mas existe um projeto de uma que vão começar e terminar ninguém sabe quando.
Teatro estadual até quem tem um, mas está inacabado, assim como toda a
estrutura que abrigará a administração do Estado. Tiveram data só para ser iniciados
e esperam, pacientes, seu término.
Mesmo sem ter importância
nenhuma, a minha cidade tem uma linda e maravilhosa ponte, só que inacabada
também. Conhecida como “aquela que ligará o nada a coisa alguma”, já
gastaram quase 300 milhões de reais e, para não perder o ritmo das coisas, já
anunciaram que será entregue com pelo menos nove meses de atraso. Como a
população e até alguns jornalistas sobreviverão sem ver esta obra servindo à
população? Teremos que esperar mais um ano para comer farinha de mandioca
subsidiada? Como dizer aos nossos parentes distantes que “uma das mais
importantes obras do século” ainda não está em pleno funcionamento? E para
quê dizer que na minha cidade existem viadutos inacabados se todo mundo sabe
disto? Mas é preciso dizer que tem anel viário na minha cidade, só que, também
inacabado. Dizem que fará uma volta enorme e depois terminará bem no meio da cidade.
Incrível, não? Essa minha cidade!
Há nessa minha cidade uma Assembleia
Legislativa. É uma espécie de circo às avessas, já que faz todos nós de
palhaços. Funciona provisoriamente num lugar ermo, mas a sua nova sede já está
sendo construída há anos num lugar onde havia um circo de verdade e,
obviamente, não tem data para ser concluída. Quem não se lembra das antigas
escolas técnicas federais? Aqui nós temos o IFRO, que está sendo construído há
vários anos na zona norte da cidade. Tem alunos, direção, professores,
processos seletivos e tudo, mas quando estará pronto, ninguém sabe nem dá
notícia. Até o estádio de futebol da minha cidade, que muitos juram que será usado
na próxima Copa do Mundo, teve sua derrubada adiada várias vezes: qualquer dia
o muro cai matando várias pessoas e a ideia absurda de ser sub-sede de uma Copa.
Universidades públicas não existem na minha cidade. Na verdade tem uma só, que
apesar de ser pública se parece com uma privada e está sempre em construção. No
meu torrão tem vários açougues que funcionam como hospitais públicos, já
hospitais públicos são prometidos todos os dias pelas autoridades, mas nunca
aparecem. Dizem até que um dia será construído, não se sabe onde, um tal de
espaço multi-eventos. E assim, minha inacabada cidade vai levando a sua
inacabada e inútil vida.
*É Professor em Porto Velho.
5 comentários:
Sinceramente, todos os dias passo pelo trevo inacabado, pelo suposto viaduto inacabado, mas acho que não é pra tanto! por que não muda de cidade professor? Acredito que ser um eterno reclamador não resolve o problema. Apresente soluções! Ou pelo menos algumas ideias, já que é tão capaz e competente.
Lamentável situação da nossa cidade. Infelizmente amargamos dia após dia esta triste realidade. Mas ainda temos um sentimento que nos fazem crer numa mudança. Se chama esperança de dias melhores. Abraços Professor Nazareno.
deveria haver uma placa na entrada: "bem vindo à Porto Velho - um cidade feita nas cochas"
É meu caro professor, infelizmente nossa capital se encontra um verdadeiro lixo, principalmente agora com esse inverno rigoroso a tendência é piorar mais ainda. Quanto as obras inacabadas..essa novela não tem mesmo prazo pra acabar, resta-nos apenas, torcer para que um dia essa realidade seja modificada para melhor!
Até o mandato político do prefeito está inacabado, cadê o prefeito? Sumiu ? não acredito!
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