Sete de Setembro: Civismo
Carnavalesco
Professor Nazareno*
A farsa da Independência se repete no Brasil ano após ano sem que nada de prático mude na vida dos brasileiros. Desfiles patrióticos e totalmente estéreis são realizados em todas as cidades do país com o objetivo de comemorar absolutamente nada. As autoridades aliadas aos militares de plantão encenam pateticamente algo que, pela sua pouca importância, já deveria ter saído de cena há muito tempo. É mais dinheiro público gasto desnecessariamente. O desfile de Sete de Setembro, guardadas as devidas proporções, pode ser comparado a uma Passeata do Orgulho Gay, a uma Marcha para Jesus ou a um simples carnaval fora de época: servem apenas como ostentação sem acrescentar nada de importante a ninguém. De fato, o que mudaria em nossas vidas se estes tristes espetáculos que só sujam as ruas não acontecessem?
Em Porto Velho,
incrivelmente também há desfile de Sete de Setembro. Só que aqui os marmanjos
saem às ruas logo cedo, a partir das sete e meia da manhã quando o sol ainda
está ameno. Com seus sapatos engraxados e suas roupas impecavelmente passadas,
eles não se acanham por não dar a vez às crianças das escolas públicas que têm
de desfilar com o “sol a pino”.
Muitos alunos, coitados, desmaiam. O espetáculo circense começa logo cedo com
aviões teco-tecos, talvez sobras da Segunda Guerra, sobrevoando a cidade e
despejando ferrugem, porcas e parafusos sobre as pessoas. Um perigo se uma
dessas geringonças, cuja função ninguém sabe qual é, cair sobre a multidão.
Porém, são estas máquinas ultrapassadas e sem nenhuma utilidade que têm a
missão de nos defender de um ataque aéreo. Mas, quem nos atacaria? Os
bolivianos?
O Estado se
aproveita da data para mostrar ao povo as armas mais modernas que tem em seus
arsenais. Todos são calorosamente aplaudidos por uma multidão de incautos e
ignorantes em sua grande maioria e que mal conhecem a função de alguns órgãos
públicos que são sustentados com o nosso suado dinheiro. Uma ironia, já que a
violência campeia numa das mais violentas sociedades do mundo. Muitas destas
mesmas armas vão, infelizmente, cair em mãos erradas futuramente e armar o
crime organizado como estamos fartos de ver em noticiários na mídia. O cidadão
comum que observa tudo aquilo devia se perguntar por que tantas firulas, homens
bem treinados e autoridades responsáveis não conseguem nos dar a segurança de
que tanto precisamos. Qual o sentido de tanta “rompança” por parte de quem devia nos proteger e não o faz?
As autoridades e
os políticos devem adorar esta patetice que encenam para a plebe. É mais uma
forma de anestesiar o já alienado povão. Quem numa hora dessas lembra que, apesar
de menos fumaça, a Amazônia voltou a ser desmatada com força total neste ano?
Quem se lembra dos viadutos que ainda não tiveram sua construção recomeçada
pela Prefeitura de Porto Velho? Quem se lembra do Hospital João Paulo Segundo
que, apesar de tantas falácias e promessas, ainda não deixou de ser o açougue
que sempre foi? Ninguém lembra a educação de péssima qualidade que o Brasil
tem. Na América Latina, ficamos bem atrás de países como Chile e Argentina.
Nunca ganhamos um Prêmio Nobel, diferente dos nossos vizinhos que já faturaram
essa comenda pelo menos sete vezes nas mais variadas áreas do conhecimento. Uma
vergonha para nós!
Se o Brasil é um
fracasso onde quer que se imagine, por que então comemora a Independência de
forma tão frenética e entusiástica? Ora, é porque é uma festa, um carnaval e só
falta distribuir cachaça e drogas para atrair mais pessoas. Um país só é
verdadeiramente independente quando seu sistema de saúde pública é impecável,
quando investe numa educação de eficiência e quando dá aos seus cidadãos, de um
modo geral, uma vida com bons padrões de qualidade. E isto são coisas que a nossa
nação ainda deve a todos nós. A nossa desigualdade social é uma das maiores do
mundo, embora sejamos a sétima economia do planeta. Temos 16 milhões de pessoas
passando fome quando somos o segundo maior produtor de alimentos da terra. A nossa
violência urbana não fica a dever nada aos países conflagrados por guerras. Por
tudo isto, é cinismo puro sair de casa com bandeirinhas, acenar para
políticos em palanques, cantar hinos e festejar uma falsa independência que este país nunca
teve de verdade.
*É Professor em Porto Velho.
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