sexta-feira, 19 de junho de 2015

Sonhei morando no Inferno



Sonhei morando no Inferno


Professor Nazareno*

               Esta noite eu tive um sonho de sonhador”. Maluco também que eu sou, não sonhei que a terra tinha parado como na música de Raul Seixas. Sonhei que estava morando no Inferno. Isso mesmo: na residência do Tinhoso. E fiquei espantando com tudo o que vi na casa do Capeta. Não esperava ter encontrado nada do que encontrei. A começar pela temperatura daquele lugar. “Mil graus à sombra” era o que se dizia. Um calor infernal, no bom sentido da palavra. Tudo mentira. A temperatura no Inferno, pelo que pude observar, mal chega aos quarenta graus. Claro que a umidade relativa do ar incomoda um pouco, pois é muito alta. Frio não existe. Pelo menos aquele frio de nevar ou gear é impossível. De vez em quando, no entanto, sopra não se sabe de onde, uma brisa gostosa. Os habitantes ficam todos eufóricos, já que isto não é nada comum ali.
            Por ser um lugar muito (mal) falado, pensei que encontraria lá coisas estranhas e demoníacas. Engano meu. O Inferno, por incrível que pareça, é um lugar bom. O Satanás-mor, dirigente maior de todas as dependências dali, é quem dá as cartas, claro. Mas é muito difícil vê-lo entre os seus. E também entre os meus, os nossos e os vossos. Parece ser uma criatura muito ocupada. E não é para menos: todo dia tem festa no “braseiro”. Tem personalidades de todos os tipos como cantores, médicos, coreógrafos, poetas, dramaturgos e alunos. Muitos alunos mesmo, principalmente os que não leem. Vi também algumas “piriguetes” e “emos” nas festas, mas nada que se possa generalizar, é verdade. Tudo muito bem organizado. E mesmo sendo o Inferno não se pode comparar com certos lugares que mais se parecem com “cabarés sem a madame”.
            Não vou lhes enganar, mas pensei que encontraria lá muitos pastores, padres, freiras, bispos, papas e outros religiosos chatos. Engano de novo: não encontrei um só. Acho que todos estão no Céu. Ninguém vê ali os papa-hóstias e também aqueles pregadores bíblicos. Parece que nunca deram as caras no “mármore quente”. Pudera: naquelas trevas não existe a Parada do Orgulho Gay nem a Marcha para Jesus. Então deve ser por isso que o Capiroto não quer a presença desse pessoal por lá. Mas lembro-me bem de que estavam organizando uma tal de “Marcha para os Ateus” e também uma “Parada do Orgulho Hetero”. Dizem à meia boca que as ruas do Purgatório se encherão de gente nestes eventos. Preocupado, procurei desesperado por um grande amigo meu que tinha a certeza de que estava lá. Era o poeta Carlos Moreira. Decepção: não estava.
            Os leitores estão pensando que muitos dos políticos brasileiros vão para as profundezas. Outro engano: não se vê nenhum deles ali. Deve ser por que ajudam muito o sofrido povo e por isso o Diabo se compadece com a “boa atitude”. Fiquei surpreso, já que não vi nenhum político de Rondônia como porteiro do Cão. Vi muitos escritórios vazios de personalidades como Martin Luther King, Madre Teresa de Calcutá, Nelson Mandela, Da Vinci, Michelangelo, Nietzsche, Mahatma Gandhi e até de Shakespeare e Sartre. Machado de Assis, Fernando Pessoa e Euclides da Cunha, já estiveram naquele lugar sinistro. Percebe-se isto pela grafia de algumas palavras escritas em Português, a língua dos infernos. Toda semana o “chefe-mor” dali recebe um emissário do Céu. Eles conversam muito sobre todos os assuntos. Inferno, um lugar até bem frequentado com sua ponte escura e também com alguns de seus viadutos inacabados. Será coincidência?





*É Professor em Porto Velho.

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