sábado, 21 de dezembro de 2013

A violência nossa de cada dia



A violência nossa de cada dia

Professor Nazareno*

            Com pouco mais de duzentos milhões de habitantes, o país da próxima Copa do Mundo de futebol tem uma das sociedades mais violentas do planeta. Pior do que qualquer guerra da humanidade, aqui, em tempos de paz, são mortos anualmente mais de 50 mil cidadãos. São quase 140 homicídios por dia. A carnificina não escolhe lugar nem região: das grandes cidades e metrópoles do centro sul do país até os mais longínquos e remotos recantos de regiões mais atrasadas, conviver com a brutalidade já virou rotina para todos nós. Mais do que em qualquer outro país, no Brasil matam-se mais negros, mais pobres, mais mulheres, mais homossexuais, mais policiais, enfim, não há quem escape do horror. Infelizmente todo dia estamos sujeitos a sair de casa e não mais voltar. Instalou-se no país inteiro uma espécie de “salve-se quem puder”.
            Engana-se, porém, quem ainda acredita que essa onda de violência que varre o país há décadas é fruto apenas de ações individuais. A delicadíssima questão das drogas, as leis muito flexíveis, o Estado corrupto e a inoperância do Poder Público associados à incompetência dos órgãos de segurança estão por trás do horror. Aqui, nunca esteve tão em voga a máxima de Jean-Jacques Rousseau de que “o homem nasce puro, mas a sociedade o corrompe”. O Brasil tem hoje cerca de 540 mil indivíduos encarcerados, mas só há vagas para pouco mais de 350 mil. Abarrotado, o sistema carcerário poderia ser bem pior, pois para cada um que está preso, há pelo menos uns quatro em liberdade praticando crimes diariamente nas ruas. Hipócrita, nosso país não construiu escolas e teve vergonha de construir presídios, contrariando assim o célebre Rui Barbosa.
            Porém, a nossa sociedade, já acostumada com a guerra diária, incentiva mais ainda a barbárie. “Bandido bom é bandido morto”, ouve-se com frequência este absurdo. Bandido bom é bandido preso, julgado e condenado pelo Poder Público, sem direitos a regalias nem indultos. Isso sim seria civilidade. Violência só gera mais violência. É preciso ter inteligência para perceber que só com educação de qualidade e com justiça social poderemos enfrentar o caos. Aplaudir a morte de bandidos sem propor algo concreto para enfrentar a crise só nos torna tão criminosos quanto eles. Os incontáveis indultos a que eles têm direito preenchem uma lógica macabra: precisa-se abrir mais vagas no já sobrecarregado sistema prisional para que outros condenados cumpram também suas penas. Sem vagas há muito tempo, o sistema está em colapso.
            Além do mais, grande parte da sociedade brasileira age na contramão da História e é contra a política de direitos humanos, aceita no mundo civilizado. Triste, vejo jornalistas, professores e até advogados se insurgirem contra os defensores dessa diretriz. Sem ela, a carnificina só aumentaria e colocava o Estado brasileiro mais uma vez como vilão. Segundo o IBGE, mais de 90 por cento dos nossos presos ou são analfabetos ou têm menos de quatro anos de estudo enquanto um por cento apenas tem ensino superior. No Brasil, o crime só é organizado porque o Estado é desorganizado e frouxo. Nossas leis são elitistas e geralmente só punem “os pequenos”. Precisamos melhorar nossas escolas e investir no futuro dos nossos cidadãos, mas é muito difícil fazer isto, pois a sociedade não cobra, não quer. Na próxima Copa, o nosso Holocausto vai assombrar o mundo já que este problema não pode ser remediado: ou se investe em educação de qualidade ou nada funcionará. E isto leva tempo. Muito tempo.



*É Professor em Porto Velho.

8 comentários:

Flávio Rodrigues Lima disse...

Bom texto, boas ideias. Entretanto, historicamente vivemos em dois "brasis" com desigualdades sociais gritantes, com diferenças e desigualdades regionais enormes, com cânceres políticos dominantes que propagam a corrupção, com falta de planejamento, com a concentração de riquezas e rendas, com aumento da pobreza, com falta de investimentos no tripé da base social que deveria ser gratuita e de qualidade: educação, saúde e segurança. Para reverter esse quadro, somente um grande esforço nacional por parte dos mandatários, gestores, administradores, políticos e da sociedade de modo geral, através de mudanças de atitudes e das legislações, da formação e valorização do bom caráter e mais vergonha na cara; e somente quando eliminarmos a corrupção que corre nas veias de milhões de brasileiros que só pensam em si e nos seus, só pensam em "se dar bem e os outros que se danem". Com relação ao banditismo que ceifa vidas e aterroriza milhões de brasileiros pacatos e trabalhadores, não adianta fecharmos os olhos para o caótico sistema de Justiça vigorante nesse país. Também não adianta sermos hipócritas, pois esses marginais (que não tem respeito por ninguém e por nada) já têm muitos direitos humanos: visita íntima, salário família, consumo de drogas lícitas e ilícitas nos cárceres, uso de celulares, etc. e tal. E o povo de bem? O povo historicamente oprimido, cansado de esperar por Justiça, reage de variadas formas como, por exemplo, enfrentando os criminosos e adotando ao seu ideário de vida e ao seu instinto de autodefesa o adágio popular "bandido bom é bandido morto".

Adriano Rocha disse...

TEM TODA RAZÃO! PARABÉNS PELO POST

Mário Sérgio disse...

Enfim um comentário sensato e inteligente sem bobagens concordo

Mário Sérgio disse...

Parabens professor algo de bom pra se ler vc estar evoluindo concordo com vc.

Marcos Soares Carvalho disse...

e muita babaquice... Kd direitos humanos na porta d hospital. Vc ja viu ? pq nao completou os estudos nao quer dizer nada pq tenho o 5 ano fundamental e sou m.e. Essa corja percisa e d pena d morte cm requinte d crueldade pq se sabe pega numa arma pr mata e roubar aprende outra coisa melhor chega de ipocrisia e de conversa fiada....

Ivanilson Frazão Tolentin disse...

O texto acertou em cheio. So faltou acrescentar que para essa matanca diaria, a midia tem uma parcela grande de culpa nessa situacao. Esses programas policialesco que nao contribuem em nada para a solucao dos problemas, apenas reforcam preconceitos, mitificam bandidos. Ou seja, contribuem para que esse triste e macabro circo continuem mais atuante.

Larisse Antunes disse...

Assim como quase sempre, saímos de casa como vítima e voltamos como sobreviventes. Sempre em meu coração Nazareno

Wando Nascimento Silva disse...

Após ver esse manifesto público da Arquidiocese de Porto Velho e o da OAB resolvi comentar por dois motivos o primeiro por ser integrante dos órgãos de segurança pública a mais de onze anos, e o segundo por ser Bacharel em Serviço Social e assim conhecedor mais ainda das questões sociais que afligem a nossa sociedade.
O que percebo é que nesses momentos de insegurança todos cobram mais contingente policial nas ruas para reprimir os atos de violência e dar uma sensação de segurança, cobram respostas mais enérgicas para os atos cometidos pelos Cidadãos Infratores (OBS: termo usado conforme prevê a Lei), esquecem que os Policiais Militares, Policiais Civis, Delegados, Promotores de Justiça, Juízes, desembargadores e Ministros cumpri leis criadas por representantes desta sociedade.
Com isso quero demonstrar que a culpa dessa insegurança não é só dos órgãos de Segurança Pública ou do Judiciário, mas sim de nossos representantes a nível Municipal, Estadual e Federal, pois Legislam em Causas Próprias e ao longo de décadas negligenciam as Bases para uma Sociedade Mais Justa e Igualitária entre elas: Educação, Saúde, Segurança Pública, Habitação, Lazer, Esporte, Cultura (De Qualidade)
Desta forma quero demonstrar que a Segurança e Paz Social da nossa sociedade não serão constituídas e respeitada somente pela quantidade de policiais nas ruas, para reprimir os atos de violência ou o tempo que esses cidadãos infratores ficarão encarcerados! Mas sim quando nossos governantes respeitarem e efetivarem os direitos que nossa Constituição Federal nos garante.