Espelhos
e Miçangas em Troca da Natureza
Professor Nazareno*
A vinda de um Presidente
da República (Presidenta) a Rondônia, província distante e atrasada, é a coisa
mais rara do mundo. Poucos foram os mandatários da nação que tiveram coragem
suficiente para “apoitar” em terras Karipunas.
Como são autoridades nacionais, só vêm aqui a negócio. Dificilmente pernoitam
no lugar e mais rápido do que chegam, voltam imediatamente para os seus
afazeres na capital do país. Dilma Rousseff trouxe boas e más notícias: dentre
outras coisas, veio ajudar na “morte”
do nosso lendário rio Madeira e mostrar o que tinha para compensar um dos
maiores crimes ambientais da História da humanidade: um “trem da alegria” bancado com o dinheiro do restante do Brasil e que
espera, com isto, calar para sempre qualquer voz destoante. Porém, se a nossa
Presidente tivesse ficado uns dias a mais por aqui, certamente poderia ter
observado muitas coisas bisonhas nestas terras distantes. Uma estada
inesquecível para uma pessoa com o bom gosto que ela deve ter.
Claro que Rondônia não tem
absolutamente nada de interessante para se ver. Muito menos Porto Velho, a sua
imunda e cara capital. Mas os assessores
da Presidente poderiam tê-la levado para assistir pelo menos durante uma noite
ao Arraial Flor do Maracujá. Coitada da nossa Presidente: não haveria castigo
pior para uma autoridade. Certamente ela sofreria mais do que nos tempos em que
foi guerrilheira na inóspita região do rio Araguaia. Além do calor infernal
capaz de assar qualquer cristão e de toda a sorte de incômodos, ela poderia
perguntar por que a cultura local não tem nada de original: muito melhor do que
isso se poderia ver em Parintins, Caruaru ou qualquer outro lugar do país sem
ter que “doar seu sangue para carapanãs”.
Além do mais, onde a nossa mandatária
maior ficaria hospedada? Se não ficasse na Base Aérea da cidade, lugar
hospitaleiro e aprazível, optaria por um dos muitos hotéis daqui e, a preço de
um cinco estrelas de Dubai, passaria a noite numa espelunca qualquer com
direito a curuba, chatos, carrapatos e mucuins. Como tem muita sorte, livrou-se
do pior.
Roberto Sobrinho, o nosso
JK e mandatário maior da cidade, teria dado as boas vindas “à companheira”. Que tal começar mostrando
a obra dos viadutos? “É a tumba do PT de
Rondônia”, informaria o nosso Prefeito. Dilma ficaria encantada com tanta
competência. Não fosse a poeira e a insuportável catinga que exala das
fedorentas ruas da cidade, a nossa Presidente teria observado sem problemas o
que fizeram com os mais de 700 milhões de reais do dinheiro do PAC que fora
destinado para dar “cem por cento de
saneamento básico e água tratada para a capital dos rondonienses”. Lições
de como se administra bem o suado dinheiro do contribuinte certamente ela
levaria para, quem sabe, empregar no país inteiro. A urbanização da Vieira
Caúla, do porto da cidade, a arborização das ruas e tantas outras obras
inacabadas ou superfaturadas certamente encantariam a nossa Presidente. Claro
que ela gostaria de saber também como se governa um povo usando apenas um blog
e a mágica de se formar um Governo sem um único cidadão ficha-suja. Talvez ela quisesse
importar muitos dos nossos políticos honestos.
Na Câmara de Vereadores entenderia o que é fidelidade canina ao
Executivo.
Se Dilma sofresse qualquer
mal-estar, teria o Hospital João Paulo Segundo para resolver o problema. Centro
de pesquisa e referência no Brasil inteiro no tratamento de qualquer patologia,
este conceituado hospital certamente teria sido elogiado pela nossa Presidente
e por toda a sua equipe. No entanto, ela ficaria confusa por não entender como
mais de um milhão e seiscentas mil pessoas podem ser tão burras e idiotas a
ponto de trocar seus recursos naturais por espelhos, miçangas e quinquilharias.
Confusa, ela perguntaria por que a energia gerada nas usinas do Madeira não vai
ficar por aqui. “Vossa Excelência já
selou o destino deste rio idiota”, diria sussurrando um rondoniense nativo
com várias contas bancárias e rindo à toa por causa de uma tal isonomia e de
uma transposição. “Isso só serve para
jogar o nosso esgoto nele”, completaria o desdentado “maninho” e agora ex-beiradeiro. Ainda sem entender muita coisa,
Dilma perceberia que as palavras do matuto fazem parte do repertório de
esquisitices que certamente lhe disseram encontrar somente neste fim de mundo
mesmo.
No canteiro de obras das
usinas, a nossa Presidente veria como funcionam bem as leis trabalhistas do país
que governa. O exemplo de Jirau é emblemático. Entenderia por que é importante
um Estado pobre dispensar de grandes empresas pelo menos 600 milhões de reais
em ICMS. À noite, poderia ir ao Campus da Unir para se deleitar com a excelente
iluminação na parte da rodovia que fora recentemente duplicada. No ambiente
universitário, debateria sobre qualquer tema com os muitos intelectuais e
sábios que lecionam por lá. Quantas lições de improbidade a Fundação Rio-Mar
não teria para a nossa Presidente? Ela visitaria também a “ponte do absurdo” e constataria “in loco” como os rondonienses são dementes e usam milhões de reais
do dinheiro público para ligar o nada a coisa alguma. Tudo isto em vez de criar
centros de pesquisas, escolas de excelência, hospitais decentes e boas
universidades públicas para educar melhor os nossos jovens. Sem o menor senso
de administração pública, nossas autoridades e governantes, talvez descompromissados
com o futuro, jogam dinheiro e oportunidades no lixo. Se a Presidente Dilma não
vier mais vezes a Rondônia, outros virão certamente. Óbvio que ainda há muito o
que se levar daqui. Temos, ainda, a floresta, o Vale do Guaporé, o Cerrado, outros
rios, a Chapada dos Parecis e tantas outras coisas que a natureza nos deu. “Quem nos dá mais?”
*É Professor em Porto Velho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário