sexta-feira, 8 de abril de 2011

Somos vira-latas?

O Rondoniense e a Síndrome do Vira-latas


Ricardo Augusto*


Os moradores daqui desenvolveram uma variante pior da supracitada síndrome do underground: temos o terrível complexo de vira-latas, já mencionado pelo Anjo Pornográfico.

Certo dia em conversa com um amigo meu, iniciamos uma discussão acerca de determinada banda musical, sobre seus estilos e a sua evolução ao passar dos anos. Ao final do diálogo, concluímos que o grupo havia se tornado ruim, não por conta da música ter se deteriorado, ou dos novos membros não possuírem o talento necessário; ela havia cometido o pecado mortal de se tornar famosinha, e por conta disso seus novos seguidores não mereciam ouvir tal música.

Pra falar a verdade, provavelmente que todo brasileiro possui um pouco do que costuma se chamar de síndrome do underground. Tudo aquilo que se torna relevante pra um número maior de pessoas acaba incomodando os que originalmente tinham aquilo como algo interessante. O curioso é que esse comportamento social não acontece só no âmbito cultural, e porto velho é a prova cabal de que tal pensamento peculiar é comum também regionalmente falando. Rondônia sempre foi considerada (por seus moradores, claro) a jóia da Amazônia, uma cidade extremamente verde e de exuberância comparável somente aos cenários paradisíacos da nova Zelândia. Os moradores desse pedaço do Brasil costumam dizer que “lugar melhor não há” e, em particular os que moram em porto velho, que “quem bebe das águas do madeira não sai mais daqui”.

Pura tolice. Os moradores daqui desenvolveram uma variante pior da supracitada síndrome do underground: temos o terrível complexo de vira-latas, já mencionado pelo Anjo Pornográfico. Rondônia é bom justamente porque é ruim. Com a vinda das verbas do PAC veio a notoriedade que nós não queríamos; todos (inclusive nós mesmos) veriam nossas ruas esburacadas, os viadutos que não levam a lugar nenhum, que servem apenas como monumentos ao fracasso, e a maior concentração de bizarrices dos três poderes, no âmbito municipal, Estadual e Federal. O anonimato e a irrelevância no cenário nacional nos permitiam esquecer, digamos , do índice de desmatamento, que só em fevereiro de 2011, que atingiu quase 56% de toda a região amazônica.

Agora, com toda a mídia nacional olhando para nossas nucas, temos de agüentar o tempo inteiro os noticiários se horrorizarem com as condições desumanas de trabalho nas Usinas, ouvir especialistas dissertando acerca dos atritos entre os barrageiros e seus empregadores, que causam pesadelos a todo e qualquer analista/assessor de tribunal (que, sejamos francos, que é quem de fato acaba fazendo o trabalho dos juízes, procuradores e conselheiros). O Rondoniense médio se pergunta onde foi parar a beleza do rio madeira, das três caixas d’água e do céu, ‘sempre azul’ como diz nosso hino. Então, olha pra janela e vê que está tudo ali onde sempre esteve.

Natural que a reação de alguns seja “não sabem o que estão falando”, ou “se não gosta daqui vá embora”. Queremos continuar com aquele jeito mambembe de ex-território, sem ninguém falar que o lixo que nos cerca não cheira muito bem. Mal sabemos que quem vem de fora sabe exatamente o que está falando, e só não vai embora porque é mais fácil tirar o dinheiro do rondoniense porque ele se preocupa mais em reclamar. O que importa é que o progresso está chegando às mais longínquas partes do Brasil, e nessa longa estrada esburacada está o nosso estado. Não somos uma metrópole e não podemos pensar que num futuro próximo sejamos. Não sou muito otimista com relação ao progresso da região, por conta do problema que nenhum poder ou investimento pode consertar em curto prazo: o próprio rondoniense.



*bacharel, professor de inglês e matemática, técnico em informática nas horas vagas e adepto da filosofia de que quem faz de tudo um pouco não faz nada direito.


Um comentário:

Leandro disse...

MUITO INTERESSANTE A POSTAGEM,GOSTEI DA COMPARAÇÃO SINDROME UNDERGROUD COM BANDA REFIRIDA,QUE QUANDO COMEÇA A FICAR FAMOSA "NÃO PRESTA MAIS" QUANDO PESSOAS QUE VC NÃO CONHECE COMEÇA A OUVIR "PERDE A GRAÇA"