BR-319, uma
estrada inútil
Professor Nazareno*
Todo ano de campanha política é a
mesma ladainha: a rodovia Álvaro Maia ou BR- 319, que liga Porto Velho e Manaus
finalmente vai sair do papel e voltará a existir. Tolice, bobagem, conversa
para boi dormir, sonho inatingível, lengalenga inútil. Sem nenhuma importância
para o desenvolvimento do país, a esquecida estrada cortando o coração da
Amazônia já existiu de fato. Inaugurada em 1976, mas sem nenhuma manutenção,
ela resistiu só até o início dos anos 80 e hoje se transformou num lamaçal
intransponível durante o período de chuvas do rigoroso inverno amazônico. Os
dois governos estaduais e o governo federal sempre fizeram pouco caso da sua existência,
por isso ela desapareceu. O seu reaparecimento, no entanto, seria a repetição
de um erro que pode trazer seriíssimas consequências ambientais para toda a
região que ela corta.
Se a velha estrada não tem nenhuma
importância para o Brasil, para a região Norte é igualmente desnecessária. O
Amazonas praticamente nada produz em termos de agropecuária e a pouca produção
de Rondônia pode ser escoada pela BR-364 em direção ao sul do país. Gastar bilhões
de reais para reativar uma estrada fantasma apenas para transportar farinha
d’água e peixe Jaraqui é uma insensatez sem tamanho que vai de encontro a toda
e qualquer teoria macroeconômica. Isso sem falar que temos o melhor meio de transporte
em uso: os rios da região, cuja extensão entre as duas capitais é totalmente
navegável. Rasgar a floresta para reativar um caminho que liga “o nada a coisa alguma” é simplesmente decretar
a morte de toda a Amazônia brasileira. Com a “Trans-Jaraqui”, em pouco tempo nenhuma árvore será mais vista em
seu longo trajeto.
Fala-se que o atual govenador do
Amazonas, Amazonino Mendes, não tem nenhum interesse nessa rodovia uma vez que
ele seria dono de várias empresas de navegação. Além do mais, os manauaras e os
amazonenses de um modo geral não querem se ligar a Rondônia nem ao restante do
Brasil. Se quisessem, não teriam gasto um bilhão e trezentos milhões de reais
para construir uma ponte ligando Manaus ao Cacau Pirera e a Iranduba do outro
lado do rio Negro. Uma ponte entre Manaus e o
Careiro da Várzea e consequentemente à velha rodovia, teria tirado há
tempos a capital do Amazonas do isolamento. Mas ninguém lutou para isso. Sem
essa ponte, as duas cidades continuariam sem nenhuma ligação por terra, uma vez
que sempre haverá a necessidade de uma balsa para cruzar a área do encontro das
águas próxima a Manaus.
Decretar o fim da Amazônia e de
todas as suas riquezas naturais somente para satisfazer a vontade de meia dúzia
de turistas pobres é o fim da picada. Tolice por tolice já existe uma ponte aqui
que não tem nenhuma serventia mesmo. Chega de gastar dinheiro à toa. E quem
teria coragem de dirigir 12 ou 14 horas apenas para tomar banho de rio? Essa
idiotice nós já fazemos aqui há tempos. Humaitá já sobrevive em função de Porto
Velho e duvido que alguém de bom senso queira se ligar à “capital da sujeira”. Reconstruir a 319 seria a indução talvez ao
maior crime ambiental de que se tem notícia. As ONG’s ambientalistas do Brasil
e a opinião pública internacional deviam se movimentar para evitar mais esse
desastre ecológico. A pavimentação da BR-364, por exemplo, além da enorme
devastação ambiental e dos problemas que causou, resultou na burrice que é conhecida
hoje por Rondônia. E quem precisaria errar mais uma vez?
*É Professor em Porto Velho.
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