Dia
31 de março de 1964
Professor
Nazareno*
Há
exatos 59 anos, o Brasil entrava numa longa noite escura que duraria quase 21
anos. Foi um período triste e ininterrupto de caos, terror, corrupção,
assassinatos, exílios, perseguições, torturas, censura, ataques aos direitos
humanos e tantas outras desgraças. Um golpe militar interrompe a frágil
democracia que vivíamos desde a redemocratização do país no pós-guerra. Mas ao
contrário do que muita gente possa pensar, o golpe não foi totalmente militar.
Os milicos na verdade só foram usados vergonhosamente pela elite civil, rica e
poderosa, para barrar qualquer pretensão de se instalar um regime comunista por
aqui. Bancado e tramado pelos Estados Unidos, que viviam o auge da Guerra Fria
com a extinta União Soviética, e tinham acabado de perder Cuba para os
comunistas, o golpismo anticomunista virou moda em toda a América Latina
naqueles anos de chumbo.
Era
o início dos anos sessenta e os poderosos do Brasil, financiados pela Casa
Branca, resolvem aderir às “Doutrinas de Washington”. Banqueiros,
industriais, políticos de direita, ricos latifundiários, Igreja dentre muitas
outras instituições conservadoras e reacionárias interrompem por meio de um brutal
golpe de Estado o governo constitucional e legítimo de João Goulart. Segundo o relatório “Brasil: Nunca
Mais”, pelo menos 1.918 prisioneiros políticos atestaram ter sido
torturados. O documento descreve 283 formas de tortura utilizadas na época
pelos órgãos de segurança nos DOI-CODI. Os militares brasileiros mataram exatos
434 de seus cidadãos durante o tempo em que estiveram no poder. São números “até
baixos” se comparados aos quase 30 mil mortos da Argentina e aos mais de
três mil no Chile, que teve cerca de 200 mil cidadãos exilados pelos militares.
Só que nos países vizinhos todos os
militares assassinos foram punidos e presos exemplarmente, enquanto no Brasil
nenhum militar pagou pelos seus crimes. A Lei da Anistia salvou todos os
criminosos. Da direita e da esquerda. Talvez por isso, muita gente por aqui ainda
hoje tece loas àquele regime de exceção e de brutalidades. Pior: em 2018 os
brasileiros elegeram para presidente o senhor Jair Bolsonaro, um ex-capitão
saudosista daqueles tempos sombrios. Bolsonaro é fã do ditador chileno Augusto
Pinochet e também admirador do torturador brasileiro, o coronel do Exército
Carlos Alberto Brilhante Ustra. Esse ex-presidente do Brasil disse durante uma
entrevista que a Ditadura Militar deveria ter matado pelos menos uns 30 mil
brasileiros. Ou seja, quase cem vezes mais. Quando Bolsonaro foi derrotado para
o Lula nas urnas, outro ataque à democracia foi arquitetado.
Mas felizmente o golpe de 08 de janeiro de 2023 falhou ainda
no seu nascedouro, apesar de os golpistas terem a admiração de alguns setores
do próprio Exército brasileiro. O presidente perdedor fugiu do país e se
autoexilou nos EUA. A frágil democracia do Brasil resistiu bravamente aos reacionários
delirantes e mandou muitos desses golpistas para a cadeia. Não se sabe até
quando ainda haverá resistência democrática por aqui. A esquerda volta ao poder
depois de seis anos e assim os direitos humanos, o respeito ao cidadão, às
instituições da República e ao politicamente correto voltará a dominar por
enquanto. Devíamos fazer como disse o líder Ulysses Guimarães: “ter nojo a
qualquer ditadura”. As Forças Armadas devem ser uma instituição de Estado e
não de governo. Democracia é sinônimo de civilidade e desenvolvimento. Fora
disso, é só barbárie e caos. Por isso, não se deve comemorar o dia 31 de março
de 1964. Apenas se lamentar. E muito!
*Foi Professor em Porto Velho.