O Cabaré e a escola
Professor
Nazareno*
A República de Brazundônia é um país
muito parecido com aquele criado por Lima Barreto. Muitos chegam a dizer que se
trata da mesma nação. Porém, muitos anos separam os dois lugares e os costumes
já estão hoje um pouco diferentes nos dois territórios. Em Brazundônia o
governo local tinha como missão fazer duas grandes construções: uma escola, que
aprovasse todos os alunos para os cursos inferiores, e um inferninho, onde todos pudessem ser devassos sem ter que pagar nada
às putas. Como se tratava de um puteiro
público, todos iriam ali para se divertir e fazer as suas orações. Verbas havia
de sobra para as duas construções, mas o bordel
estava sendo construído em tempo recorde enquanto a escola sofria com a
burocracia, a má vontade e o atraso de recursos. Os empresários e políticos do lugar só destinavam
verbas para o prostíbulo.
As autoridades brazundonenses
colocavam anúncios na televisão e nas redes sociais dizendo que estavam muito
preocupadas com a construção da escola e de tudo fariam para que não houvesse
nenhum atraso no início do ano letivo. Mas era tudo mentira, uma vez que as
empreiteiras contratadas para as obras só davam prioridades para embelezar o lupanar. Na verdade aquela casa da luz vermelha nunca deixou de
funcionar. As ações inerentes à orgia eram realizadas ali mesmo, à luz do dia
ou na escuridão da noite. A reforma era apenas proforma só para satisfazer os
pagadores de impostos mais enjoados. Já na escola, tudo parado, nada andava. Um
dia levantavam uma parede e no outro a derrubavam alegando erro de cálculo ou
qualquer outra coisa. As desculpas para que aquela obra nunca ficasse pronta a
tempo sempre apareciam. Nem a escola
nem a casa de massagens estavam
prontas, mas enquanto em uma não havia aulas, reuniões nem debates de
conhecimentos na outra as lascívias funcionavam normalmente todos os dias. E
parece que esta situação esdrúxula não incomodava muita gente. Os cidadãos de
Brazundônia dizem que a educação de qualidade vem em primeiro lugar, mas é no rendez-vous que passam o dia inteiro
enquanto na escola apenas meio turno por dia para seus filhos. Sem aulas,
muitos alunos estão felizes. Muitos até brincaram o Carnaval sem preocupações
com provas, aulas chatas ou testes. A maioria dos professores ri feito criança,
pois ganham o salário integral sem precisar dar uma única aula. Os pais nem se
preocupam. “Os professores e a Direção
sempre darão um jeito para as coisas terminarem bem para todos”, afirmam.
Em Brazundônia sempre foi assim
mesmo: tudo para a zona e pouca
coisa ou quase nada para a educação. “Fazer
reformas de escolas durante as férias não tem graça, pois ninguém iria perceber
que estamos trabalhando”, dizem na maior cara de pau alguns funcionários do
governo local. “Investir no baixo meretrício é uma aposta correta
nos futuros homens da nossa nação”, dizem outros. No país libidinoso,
primeiro o futebol, depois o Carnaval e as bandas, as novelas, a fofoca, o BBB
e por fim as escolas. Algumas são particulares, mas mesmo assim colocam poucos
alunos para cursar o ensino inferior. Em época de eleições como agora é
importante não criar problemas com a comunidade, por isso as aulas poderão
começar só depois do meio do ano. Assim, todos ficarão alegres. Na nação
inteira muitos entendem que é mais correto as verbas serem destinadas sempre ao
alcoice e nunca para as escolas.
Para que, né?
*É
Professor em Porto Velho.
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