Confissões de um
bandido
Professor
Nazareno*
Miguel das Beiradas sempre foi um
bandido de carteirinha. Filho de uma família de classe média e muito ambicioso
nunca escondeu seu desejo de ficar rico nem que fosse à custa dos outros. Hoje,
administra um cabaré da
periferia que tem muitas putas e a fama de sempre atender mal aos seus
clientes. O dito puteiro
sempre foi a salvação moral das famílias da redondeza e por isso conta com a
permissão de todos para funcionar. Miguel não deveria ser o administrador
daquele inferninho, mas
através de suas artimanhas conseguiu chegar facilmente à liderança daquela Casa da Mãe Joana. É odiado por
quase todos que vivem ali. Tem menos de três por cento de popularidade, mas
insiste em ficar no comando daquele antro
de perversão. Miguel e seus comparsas sempre acreditaram ser os
salvadores do bordel, por
isso não vão sair tão fácil dali.
Outro
dia, muito irritado com algumas críticas, o bandido desabafou: “as senhoras da alta sociedade, alguns
políticos, a mídia, os empresários, os reacionários em geral, a Igreja e muitas
pessoas de bem bateram panelas para que eu assumisse o comando dessa zona e agora muitos começam a me
fazer críticas”. E continuou: “a verdade
é que este prostíbulo nunca
teve organização, nunca teve justiça social, nunca teve preocupação com os mais
necessitados e toda a riqueza que produziu sempre foi parar nas contas dos mais
ricos, dos mais ladrões e dos corruptos, por que querem que eu faça o milagre
de consertar as coisas em tão pouco tempo”? Questionou com certa razão. Ele
ficará à frente do lupanar de
quinta categoria mesmo que funcionários e clientes não aceitem. Não há, por
enquanto, ninguém hábil para comandar aquele lugar.
“Esse meretrício
não terá jeito nunca. As quengas daqui são passivas demais, muitas vezes elas
trabalham de graça e ainda têm que pagar pelos preservativos”, falou o
escroque político com certo conhecimento. Realmente: no harém nada funciona. Ninguém contesta nada. Todo mundo é
roubado, vilipendiado, humilhado e todos ficam à espera de um salvador da
pátria que nunca chega. O mundo inteiro olha para o rendez-vous com ar de pouca credibilidade. “Eu vou mudar as leis deste putanato para colocar as coisas
em ordem”, costuma bradar na mídia o impopular mandatário. “Darei incentivo ao trabalho escravo, cortarei
empregos, venderei a preço de banana as riquezas que temos, diminuirei o
salário de todos e criarei privilégios somente para os meus amigos”,
costuma se orgulhar, certo de que nada vai lhe acontecer na Justiça.
E continuou: “todo mundo sabe que neste covil
nunca houve justiça social ou qualquer outra coisa que beneficiasse os mais
pobres e carentes, por que só agora me cobram essas sandices?”, questionou
enfaticamente. Por se tratar de um inexpressivo conventilho de mundanas tudo ali funciona “a meia boca”. Os três poderes estão totalmente
desmoralizados, os políticos desacreditados, em algumas partes o crime
organizado manda no Poder Público, a baderna e o caos ameaçam tomar conta de
tudo, o descrédito é geral, mas ainda assim não há a menor possibilidade de
convulsão social. Nesta casa das tias, de acordo com a lei, só três coisas
não se podem fazer: dirigir embriagado, se envolver sexualmente com menores de
18 anos e atrasar pensão judicial. O resto, em tese, é tudo permitido: roubar o
Erário, desviar verbas da Educação, mentir para ser eleito e enriquecer ilicitamente.
Em que outro bacanal ou motel se vê isso?
*É Professor em Porto Velho.
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