Ballet
sem muito glamour
Professor
Nazareno*
Pela segunda vez
em menos de um ano, não se sabe ainda o porquê, o Ballet Nacional da Rússia se
apresentou em Porto Velho, a longínqua, quente, feia, brega e desarrumada
capital de Rondônia. Só que desta vez foi diferente. Havia palco um pouco mais
decente: era o suntuoso e badalado Palácio das Artes de Rondônia. Depois da
desratização e do combate aos cupins que infestavam aquela casa de shows e já
com o alvará definitivo, os russos apresentaram para uma minúscula plateia, que
sequer ocupou metade das cadeiras disponíveis, o espetáculo “Stars of the
Russian Ballet”. Diferente também foi o evento encenado pelos visitantes.
Não foi como no ano passado com lindas coreografias e danças quando pelo menos
40 dançarinos apresentaram pela primeira vez aqui “O lago dos cisnes” na
Boate Talismã 21 na zona leste desta capital.
Oito, isso mesmo, só oito dançarinos
este ano fizeram a festa para os atônitos espectadores rondonienses. A
impressão é que os russos que vieram o ano passado tiveram medo de encarar mais
uma vez a “capital das sentinelas avançadas”. Também pudera: dançar um
espetáculo grandioso e reconhecido no mundo inteiro em uma casa de pagode deve
ter sido algo inusitado para aqueles artistas. Além disso, o preço de 260 reais
em média para ver “pessoas dançando” não combina com a situação de
penúria de uma cidade extremamente pobre e miserável como Porto Velho. Público
aqui só mesmo para música brega, pagode, sofrência, sertanejo universitário e
duplas caipiras que cobram em média 30 ou 40 reais por ingresso. Ballet deve
ser outro nível. Pior: quantos por aqui entenderiam o significado de Spartacus,
Giselle, Carmen ou Dom Quixote?
Se o preço não tivesse sido
drasticamente reduzido pela metade, infelizmente a plateia teria sido menor
ainda. E mesmo não tendo sido um ballet de repertório, a excelência e a
competência dos dançarinos russos valeram a pena. O problema é que no mesmo dia
e hora “Os gigantes do samba” com Belo e Alexandre Pires estavam se apresentando
na zona leste. Será que numa cidade de matutos e beiradeiros como Porto Velho o
Ballet pode competir com o pagode? A Talismã 21 não coube de tanta gente. Ouvi
dizer que ficaram pessoas do lado de fora. Guardadas as devidas proporções,
assistir a um espetáculo de ballet requer certa postura diferenciada. Infelizmente
não vi uma única bolsa Louis Vuitton lá dentro do Palácio das Artes. Yves Saint
Laurent ou Dolce & Gabbana nem pensar. Só mesmo as compradas na Bolívia ou
na Rua Jatuarana.
Para desgosto geral, pessoas
desarrumadas, mal vestidas e totalmente fora de moda foi o que mais se viu
dentro do teatro rondoniense. Bem diferente de Viena, Áustria, quando lá estive
no “Wiener Staatsoper” e assisti a um belo espetáculo de ballet e de
música clássica. O glamour, o charme, o encanto, a beleza e a elegância eram
facilmente notados. Aqui, a iluminação não combinava com as coreografias e a
música sempre começava depois que os bons bailarinos haviam começado a dançar.
Como se não bastasse, havia o medo de ser roubado ou mesmo levar um tiro no
estacionamento de fora do teatro. Escuridão, lama, calor extremo, poeira, violência,
pouca cultura e medo nas ruas definitivamente não combinam com a boa música e a
dança de alta qualidade. Apesar de tudo isso, progredimos: saímos de uma casa
de pagode na periferia e entramos em um teatro. Não se sabe até quando. A
paciência dos russos pode acabar.
*É Professor em
Porto Velho.
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