O Bolsonarismo é grotesco
Pastor René Kivitz*
Nós não estamos discutindo
Lula e Bolsonaro. Nós estamos discutindo modelo de sociedade. E o modelo de
sociedade que o Bolsonarismo traz para mim ele não é compatível com a minha
sensibilidade espiritual, cristã, humana, cidadã. Eu não posso admitir que um
jornalista e um ambientalista sejam mortos na floresta e o presidente diga que
a culpa é deles, o que eles foram fazer lá? Eu não posso admitir e achar que é
normal um sujeito invadir uma festa de aniversário de uma família e assassinar
o aniversariante na frente da sua esposa e de seus filhos. Eu não posso admitir
que seja normal um irmão puxar um revólver dentro de um templo no meio de um
culto e dar um tiro no outro e o culto continuar. Mas Ismael o quê que o
presidente tem a ver com isso? Então eu não estou falando do Bolsonaro. Eu
estou falando do bolsonarismo.
Estou falando de uma
cultura. De uma mentalidade. Não posso admitir que alguém saia na rua com
suástica e que alguém faça discurso nazista e que ache que isso é liberdade de
expressão, direito de opinião. Eu não posso admitir um negócio desse. Então o
sujeito que vem falar comigo: ah! E o PT? Ah! Para, faz favor. Não estamos
discutindo corrupção. Nós estamos discutindo muito mais coisas aí. Pense o que
teria acontecido se um preto no saguão do aeroporto disparasse acidentalmente
uma arma de fogo. O ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, fez isso no saguão
do aeroporto. E aconteceu o quê? Nada. E se fosse um homem preto? Pense o que seria
desse Brasil o que teria acontecido no Brasil se ficasse comprovado que a
família do presidente Lula comprou 51 imóveis em dinheiro vivo?
Se ficasse comprovado que os
filhos do presidente Lula homenagearam milicianos e deram empregos para eles nos
seus gabinetes? O que teria acontecido nesse país, como que a elite do poder
político do Brasil teria tratado o presidente Lula se o vizinho, assassino,
tivesse uma filha que namorasse com um de seus filhos? Então o que acontece com
o Brasil é grotesco na minha opinião. Nós temos 3% da população do mundo e 11%
das vítimas de Covid. De cada cinco brasileiros que morreram quatro mortes
poderiam ter sido evitadas. Nós temos 700 mil pessoas que morreram com um
presidente da República que fez motociatas, mas não foi visitar um hospital.
Nós não estamos falando de corrupção, nós estamos falando de modelo de
sociedade. E o modelo de sociedade no Brasil é de tal ordem que o Mandetta, que
foi Ministro da Saúde, que propôs um protocolo alinhado com a OMS, a
Organização Mundial da Saúde, teve que sair do governo e não foi eleito. Mas o
Pazuello, o general subserviente ao chefe de Estado, o presidente Bolsonaro,
que deu ordem para cancelar compras de vacinas, ele foi eleito.
Que Brasil é esse? Que
Brasil é esse que o Ricardo Salles, que fez passar uma boiada no sentido de
desmantelamento dos órgãos de controle das florestas, recebe mais votos do que
a Marina Silva? Que Brasil é esse? Então, nós não estamos discutindo mais corrupção. Falar em corrupção com orçamento
secreto, que o presidente vai dizer que não é problema dele? Como não é
problema dele? Um orçamento secreto que é um escândalo de corrupção muito maior
do que foi o chamado Petrolão. Nós não estamos falando de corrupção. Nós
estamos falando de modelo de civilização, de modelo de sociedade, né? Uma
sociedade que quer manter-se estratificada. Eu insisto nisso já, infelizmente,
faz tempo.
Nós temos um contingente
significativo da nossa sociedade que quer manter a ordem social estabelecida.
Homem vale mais do que mulher. Hetero vale mais que gay. Magro vale mais que
gordo. Branco vale mais que preto. Rico vale mais que pobre. Europeu e
americano valem mais que brasileiro, sul-americano e africano. É isto que está
posto. Quando você tem um ministro da Economia que diz que o dólar está muito
baixo e que agora a empregada doméstica quer ir para a Disney. Quando você tem
um ministro da Educação que diz que a universidade não é para todo mundo.
Quando você tem um ministro da Educação que diz que pobre tem que fazer curso
técnico, nós estamos falando de modelo de sociedade e de civilização.
Quando você tem uma ministra
da Mulher e dos Direitos Humanos que diz que menino veste azul e menina veste
rosa nós não estamos falando de corrupção, nós estamos falando de modelo de
civilização. Quando nós temos uma sociedade em que a religião que se torna
hegemônica se julga no direito de depredar, destruir, incendiar terreiros de
religiões de matriz afro, não estamos falando de corrupção. Quando nós temos um
pais estruturalmente racista que ainda discute a legitimidade de cota racial,
nós não estamos falando de corrupção. Nós estamos falando de modelo de
sociedade. E eu lamento muito ser uma das vozes dentro da Igreja que vocaliza
esse tipo de discurso porque dizem: Ah! então você é Lula. Você é... E o PT?
Rapaz, faz favor! Não estamos discutindo corrupção.
P.S: Precisaríamos, então, discutir sobre o genocídio dos Yanomamis durante o governo de Bolsonaro ou
também temos que nos calar diante da monstruosidade em terras indígenas ?
*Texto do Pastor René Kivitz, teólogo, conferencista e escritor em São Paulo.
(Transcrição da entrevista do pastor feita por Professor Nazareno)
https://www.facebook.com/dinah.winchester.1/videos/601793765090647
Nenhum comentário:
Postar um comentário