Os ‘zeróis’ da
menstruação
Professor
Nazareno*
O presidente Jair Bolsonaro vetou
recentemente a distribuição de absorventes higiênicos pelo governo para as
mulheres pobres e em situação de vulnerabilidade. “O Estado não tem de onde tirar os recursos para custear esse projeto”,
afirmou o nosso mandatário. O país quase parou. Foi uma comoção nacional e
quase todos os políticos, da esquerda até à extrema-direita, fizeram discursos
patrióticos e emocionados em defesa das mulheres. Muitos deputados, prefeitos e
governadores, contrários ao veto presidencial, já prometeram que vão remanejar
verbas para atender a essa demanda “extremamente
importante” para o público feminino. Alguns lembraram que o poder público
já há muito tempo distribui, sem maiores problemas, o preservativo masculino
principalmente durante o período de Carnaval. “Para isso há verbas sobrando”, dizem.
Não se pode discutir a importância
do uso de absorventes íntimos pelas mulheres. Principalmente as presidiárias e
também aquelas que não têm de onde tirar recursos para arcar com mais esta
despesa em seus apertados orçamentos. Muitas meninas das classes pobres, por
exemplo, perdem aulas quando estão menstruadas. Não há dinheiro sobrando para
comprar absorventes. Algumas usam papel higiênico, sacolas de supermercados,
miolo de pão e até panos velhos. Todas elas correm sérios riscos de contrair
infecções, desenvolver alergias e infertilidade, que em casos mais graves pode
levar até ao óbito. Mas a discussão maior não é esta. O governo deveria
aumentar o salário mínimo ou então criar melhores condições para aumentar o
orçamento familiar dos brasileiros. O nosso menor salário é de apenas 190
dólares. Uma vergonha infame.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco,
já disse que o veto do Bolsonaro a esse projeto do absorvente feminino “é candidatíssimo a ser derrubado”. Ou
seja, a nata dos políticos brasileiros se uniu em prol de um objetivo nacional
e inadiável: proteger a menstruação de parte das brasileiras de baixa renda.
Enquanto isso, muitas dessas mesmas brasileiras continuam frequentando as “filas do osso” espalhadas pelo Brasil a
fora. Várias delas se alimentam de pelancas, pés de galinha e osso. Há muito
tempo que a fome e a miséria “já virou rotina” nas classes sociais menos
abastadas deste país e ninguém, absolutamente ninguém, toma providência. A
questão do absorvente feminino virou uma “cortina
de fumaça” para esconder problemas mais urgentes da nossa sofrida
população. A inflação galopante no atual governo condena muitos a mais pobreza
ainda.
Incompetente, o “Mito” já disse que não há o que fazer
para debelar a alta dos preços que assombra o país. Ou seja, a transferência de
renda dos pobres e miseráveis para as classes mais abastadas neste governo
insano e monstruoso continuará “na cara
das autoridades”. Em vez de mostrar exagerada preocupação com a menstruação
das mulheres, a classe política do Brasil deveria lutar para combater as
vergonhosas filas de pessoas mendigando ossos e pelancas para poder se
alimentar. A luta para diminuir a nossa monstruosa desigualdade social e as
nossas injustiças traria muito mais efeitos positivos para os cidadãos e
cidadãs deste país. Um salário mínimo de 800 ou mil dólares mensais acabaria
com grande parte da miséria em que vivemos. E daria também para comprar, com
sobras, os absorventes femininos. Os nossos políticos já usaram de tudo para se
promover e ganhar votos. Mas usar menstruação é a primeira vez que se vê.
*Foi
Professor em Porto Velho.
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