E se nada der
certo?
Professor
Nazareno*
Alunos do Ensino
Médio de uma escola particular gaúcha, o Instituto Evangélico de Novo Hamburgo
(IENH), na região metropolitana de Porto Alegre, promoveram uma “atividade pedagógica” chamada “Se nada der certo” e se vestiram com
roupas de empegadas domésticas, faxineiras, motoristas de ônibus, ambulantes,
garis, cozinheiros e outras profissões que “na
visão deles” representam o fracasso na escala trabalhista do país. A
chiadeira foi geral. A hipocrisia tomou conta das redes sociais como se o mundo
tivesse acabado. Nada mais natural num país cuja sociedade sempre foi dividida,
como no livro Casa Grande e Senzala de Gilberto Freyre. A atividade foi
preconceituosa, sim, pois não levou em conta a importância dessas profissões
nem o grau de felicidade e empatia que esses profissionais possam ter. Mas foi
realista e retrata o que é o Brasil.
O nosso país tem
mais de 500 anos e nunca deu certo. É um fracasso quando comparado com as
potências mundiais de verdade. Somos o país do jeitinho, da gambiarra e ninguém
nunca reclamou. Os alunos poderiam ter se fantasiado de político. Presidente da
Câmara, deputado federal, prefeito, vereador ou mesmo senador da república não
faria diferença. De preferência todos eles vestidos de presidiários e
com algemas. Ou você vai dizer que a profissão de político no Brasil é algo que
deu certo? Qualquer um dos alunos poderia ter se fantasiado de Michel Temer com
o seu governo golpista e fracassado que também nunca vai dar certo. Ser
ambulante, vendedor de picolé, camelô, pipoqueiro ou outra profissão afim
significa um fracasso? Sim. Pelo menos em nossa cidade a atual administração do
PSDB não os vê com bons olhos.
Porto Velho, por
exemplo, também nunca deu certo como cidade. É uma porcaria só. Um eterno
fracasso. É, segundo dados do IBGE, a latrina do Brasil, a desgraça do mundo. A
nossa capital é suja, mal administrada, violenta, podre, fedorenta, sem água
tratada, repleta de obras eleitoreiras e inacabadas, com lama no inverno e
poeira no verão, com apenas 2% de esgotos e saneamento básico, sem arborização
e com o pior IDH dentre as capitais do país.
Mas muitas pessoas tolas declaram amor ao lodaçal como se aqui houvesse
coelhinhos saltitantes e borboletas azuis. Muitos cidadãos porto-velhenses
comodamente fecham os olhos para a carniça e a fedentina. Com mais de cem anos,
até agora nada deu certo na capital dos “destemidos
pioneiros”. Só umas letrinhas no caminho do aeroporto parecem ter conseguido
aprovação geral.
Tolice
repreender a escola gaúcha e seus alunos. Basta encarar a realidade deste país
chinfrim sem ética e sem respeito pelos ditos mais humildes. Quem não quer que
seu filho seja médico, advogado ou engenheiro? Nenhum professor dá aulas para
seus alunos e torce para que eles sejam vendedores de balinhas de gengibre nos
sinais ou as suas alunas se transformem em “lavadeiras
de cuecas de marido”. Muito menos para serem garis ou diaristas. Porém, se
dar bem na vida não é necessariamente ter profissões reconhecidas como sendo da
elite. Muitas vezes quem passa, arruma, limpa, conserta, vigia e lava pode ter
mais equilíbrio pessoal, felicidade e empatia do que muita gente que estuda em
colégios grã-finos e esnoba outras profissões. Só que não tem dinheiro nem fama,
termômetros ridículos em nosso meio social falido. E talvez nunca se eleja
político. Juro que não entendi: por que nenhum dos alunos se fantasiou de
professor?
*É
Professor em Porto Velho.
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