quarta-feira, 14 de junho de 2023

As consequências do frio

As consequências do frio

 

Professor Nazareno*

 

            Frio extremo em Rondônia! Caminhamos a passos largos para o fim do mundo, é a crença que se tem nestas terras tórridas. Lugar de baixas latitudes e por isso mesmo muito quente e abafado, eis que a “terra dos destemidos pioneiros” se vê de uma hora para outra sob a influência de uma forte massa de ar polar continental. O fenômeno da friagem chega enfim às terras karipunas baixando as temperaturas para algo em torno dos 23/25 graus. Há relatos de que em algumas cidades do interior, como Vilhena e Guajará-Mirim, o “frio neste atípico verão foi mais intenso ainda. Acostumados aos quase 40 graus diários e com direito a mormaço e muito suor, os rondonienses bateram o queixo. Ainda assim, muitos desejam ardentemente que esta “friaca atemporal” se transforme eternamente no clima típico dessas quentes paragens. “Devia ser sempre assim”, afirmam.

            O problema é que esse pitoresco “clima de frio intenso” traz muitas consequências para os rondonienses e porto-velhenses principalmente. Apesar de não termos tantos mendigos perambulando pelas ruas como em algumas ricas e abastadas cidades do sul do país, o festival de bizarrices por aqui é uma constante. O mau cheiro de barata, mofo e naftalina dos agasalhos doados pelos parentes sulistas toma conta das já sujas e imundas ruas da capital. Desacostumados com a novidade climática, é comum ver algumas pessoas “desfilando” com suas estranhas “roupas de inverno”, que usam no dia a dia somente para dormir no frio de seu ar condicionado. Outra consequência desse frio é o aumento no uso de lenha, carvão e gás de cozinha, não para aquecer os ambientes da casa, mas para esquentar água para o banho diário, já que quase não há chuveiros elétricos por aqui.

            Só que com a temperatura mais amena, Porto Velho fica muito mais fedorenta e insalubre, pois a catinga das ruas e dos esgotos, que correm a céu aberto pela cidade, não se dissipa tão facilmente. O bom é que os ratos, cobras e outros animais peçonhentos não saem às ruas facilmente. Moscas varejeiras e urubus também desaparecem das avenidas e latas de lixo espalhadas pelas calçadas nestes dias de clima um pouco mais diferente. Fala-se que neste clima até os políticos de Rondônia roubam menos. Quase não se fala em escândalos de desvios de verba pública. Talvez seja porque a classe política acha que está na Europa, no Japão ou mesmo em algum país mais desenvolvido e civilizado onde a roubalheira é bem menor do que nestas terras inóspitas e incivilizadas. Neste clima, a Praça Marechal Rondon, por exemplo, fica muito mais parecida com a  Fontana de Trevi.

            Como já disse: Porto Velho e Rondônia definitivamente não combinam com o tempo gélido. Isso é temperatura para lugares ricos e bem desenvolvidos. Porém, vi algumas emissoras de rádios da capital e também alguns supermercados fazendo a campanha do agasalho como em alguns dos mais frios lugares do sul do país. Não é incrível a sensibilidade dessa gente? Tomara que os termômetros subam logo. É muito deprimente ver cidadãos usando roupas rotas, molambentas e folgadas que não lhe cabem no corpo. Até para comer alguma coisa nestes dias lúgubres é difícil. Farinha d’água com peixe frito, tacacá e banana frita deviam ser sinônimos só de calor e de dias ensolarados e calorentos. Para beber algo é outro tormento. Existe coisa mais bizarra e antiquada do que presenciar muitos rondonienses bebendo vinho vagabundo daqueles vendidos em garrafas de plástico? À espera da fumaça e da devastação ambiental, celebremos o “frio”.

 

 

*Foi Professor em Porto Velho.

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